sexta-feira, 30 de outubro de 2009

ESPÍRITAS E ESPIROLAS

Por Joana Abranches

Já faz algum tempo, uma antiga vizinha sem papas na língua, me vendo sempre às voltas com atividades na Casa Espírita, um dia não resistiu e em meio a uma conversa acabou "soltando" que eu era "muito carola!" Levando a coisa na farra, tentei argumentar: - "Mas eu sou espírita e não católica..." Ela aí não titubeou: - "Então é espirola."

O pitoresco virou piada, mas trouxe à tona uma séria questão. Até onde nós, espíritas, estaremos descambando para o igrejismo e a superficialidade?

Temos visto Grupos tão obsecados com assiduidade e pontualidade, tão cheios de regras, critérios, exigências e uma intolerância tal, que mais parecem a velha e inquisitorial igreja romana da idade média que oficinas fraternas de estudo e vivência do Evangelho de Jesus.

Onde foi que perdemos o rumo da fraternidade? Que paramentos invisíveis ainda nos fazem oscilar entre a pseudo-superioridade dos sacerdotes e a submissão dos beatos?

Em um dos costumeiros papos fraternos com meu saudoso amigo Palhano Jr., uma vez questionei: - Por que será que os espíritas se digladiam tanto por cargos, até mesmo naqueles grupos minúsculos que ficam lá onde Judas perdeu as botas?... Bem-humorado, como sempre, ele me respondeu com uma risadinha marota: - "A briga é pelo poder sobre as almas, minha cara. Muitos espíritas ainda se alimentam da autoridade clerical que tinham, quando nas fileiras do catolicismo. O poder vicia."

Para esse autoritarismo rançoso, o que não faltam são defesas equivocadas. Afinal, Emmanuel recomendou: "Disciplina, disciplina, disciplina." Foi o bastante para que instruções superiores, aplicadas a um contexto específico, se tornassem o jargão justificador da inflexibilidade fria que campeia em nosso meio e que vêm transformando nossas instituições - destinadas a ser escolas do amor - em verdadeiros quartéis de controle e enquadramento. E quantos exageros em nome da disciplina...

Certa vez, uma palestrante habitualmente pontual, chegou à nossa reunião pública em cima da hora. Estava mortificada. Por mais que tentássemos deixá-la à vontade, repetia sem parar que "a espiritualidade tem horário a cumprir." Naquela noite o seu desempenho, obviamente, não foi dos melhores, porém, é perfeitamente compreensível a reação da companheira. Ocorre que se os dirigentes espirituais levam em conta que estamos na matéria, sujeitos a limitações e imprevistos comuns à vida terrena, os dirigentes encarnados, em grande maioria, não o fazem. Numa afirmação de poder, até mesmo inconsciente, sobretudo com relação aos médiuns, insistem em generalizar, e saem por aí a prodigalizar suspensões ou prescrições de inumeráveis passes e palestras doutrinárias, até que o faltoso ou atrasadinho, supostamente reequilibrado, mas no fundo, punido, possa então reconquistar a permissão de voltar às atividades... Haja penitência!

Façamos o dever de casa. No Livro dos Médiuns, cap.XXIX, top. 333, ao tratar das reuniões espíritas, o codificador é muito claro: "Se bem que os espíritos prefiram a regularidade, os verdadeiramente superiores não são meticulosos a este ponto. A exigência de uma pontualidade rigorosa é um sinal de inferioridade, como tudo o que é pueril."

É preocupante, também, a falta de naturalidade com que as pessoas têm se comportado no ambiente espírita. Observa-se uma despersonalização e um formalismo alarmantes, em lugar da camaradagem espontânea que deveria existir entre irmãos. Não raro, rir e brincar interreuniões parece ser, implícita ou explicitamente, proibido: - "Quebra a vibração." Cada vez mais, os cumprimentos espontâneos e afetivos têm dado lugar a frases feitas, piegas e que soam muito falso. Na fala, como na escrita, temos substituído expressões carinhosas e simples do cotidiano por uma linguagem impessoal, "santificada" e obsoleta, incompatível com os novos tempos. Ah, as palavras ensaiadas... Os gestos contidos... Ladainhas do passado, ainda tão presentes, a nos distrair de nós mesmos...

Nas Casas Espíritas, dirigentes preocupados apenas em dirigir e coordenadores tão somente concentrados em coordenar, esquecem o essencial: AMAR. Casas se agigantam e pessoas viram número, em ambientes tão impecáveis quanto frios. Alguém notou a tristeza daquele companheiro ou a ausência daquele outro? Ocupados em crescer, no quantitativo, ignoramos Kardec a recomendar grupos pequenos e o alerta do próprio Chico, que já dizia: - "Em Casa que muito cresce o amor desaparece."

Perdidos numa burocracia sem sentido, senhas e formulários vão aos poucos tomando o lugar do coração e transformando nossos atendimentos fraternos em patética mistura de clínica psicológica e confessionário, onde o indivíduo precisa seguir à risca as etapas cronometradas do tratamento para obter "alta" ou "absolvição." Assim, desorientados orientadores, em tom grave e superior, seguem dando receitas iguais para problemas diferentes. Alguém sofreu uma perda e busca notícias do ente querido desencarnado? Que vá "baixar" noutro Centro, porque nos mais ortodoxos ouvirá rispidamente que o telefone só toca "de lá pra cá" e fim. A alegação é que a mediunidade não está a serviço de problemas "domésticos" e sim de coisas mais sérias. Valei-me Chico Xavier! Quanta saudade da mediunidade a serviço do amor, do consolo aos desesperados de toda a sorte...

Nas reuniões públicas, companheiros carrancudos às portas das cabines de passe chamam com voz cavernosa: - Os próximos! E aquele que está indo pela primeira vez fica a imaginar que ritual terrível deve acontecer naquela salinha escura onde todos entram cabisbaixos, como bois para o matadouro. Diretores severos, após comoventes preces, olham por baixo dos óculos com olhar de censura para a mãe de alguma criança que chora, ou pedem que se retire. Médiuns coreografados sincronizam movimentos como se fossem clones uns dos outros. Qualquer semelhança com farisaísmo, lamentavelmente, não será mera coincidência?

Na Evangelização, criança que chega atrasada volta; Se falta muito é cortada, mesmo aquela que mais precisa da orientação e do pão. A mãe, senhora simplória assistida pelo Grupo e que muitas vezes sequer tem o dinheiro da passagem, ouve um duro sermão de alguém que ignora a sua difícil realidade. Normas são normas. Quem negligenciar a frequência dos filhos não tem direito à cesta básica. O tom é incisivo. Muitos dirão que é necessário usar estratégias para evangelizar "os nossos irmãos que mais precisam". Talvez tenham razão... Parece que só os espíritas já não precisam mais do Evangelho...

Navegantes desatentos às ciladas da superfície, não percebemos o risco de naufrágio iminente. Parecemos surdos à conclamação do Espírito de Verdade: - "Espíritas! Amai-vos, este o primeiro ensinamento" - E indiferentes à terna advertência de José, Espírito Protetor, a nos lembrar que "a indulgência atrai, acalma, reergue, ao passo que o rigor desencoraja, afasta e irrita."Até quando continuaremos atraídos pelo canto da sereia?

Há que se ter humildade para repensar nossas práticas doutrinárias, reconhecer equívocos, resgatar a doutrina simples e libertária de Jesus. Há que se ter coragem para mudar, para substituir a frieza dogmática que tem nos engessado pela convivência fraterna, calorosa e solidária que nos identificará, de fato, como cristãos redivivos.

Espíritas ou "espirolas"... O que temos sido? O que realmente queremos ser? Cada um se perceba e se responda.

Ainda há tempo.

*Joana Abranches é Assistente Social, escritora e Presidente da Sociedade Espírita Amor Fraterno Vitória/ES -

quarta-feira, 14 de outubro de 2009

Benefícios do Conflito

“As reuniões espíritas oferecem grandíssimas vantagens, por permitirem que os que nelas tomam parte se esclareçam, mediante a permuta das ideias, pelas questões e observações que se façam, das quais todos aproveitam. Mas, para que produzam todos os frutos desejáveis, requerem condições especiais, que vamos examinar; porquanto erraria quem as comparasse às reuniões ordinárias.”


O Livro dos Médiuns – cap. XXIX – item 324



Feliz e inspirada recordação do Codificador. Comparar as reuniões espíritas a qualquer ajuntamento seria perder seu caráter educativo, seus frutos desejáveis. Com muita propriedade ele se refere às condições especiais, concitando-nos a pensar sobre os cuidados na condução dos grupos.


Uma situação amiúde conturbadora das reuniões, sejam elas de que natureza for, são os conflitos entre seus componentes. O entrechoque de ideias gera as escaramuças, depositárias de alta dosagem de sentimentos nem sempre ajustados ao bem e ao crescimento grupal. Estabelecem-se elas rotineiramente como expressão tácita das diferenças, conquanto nem sempre sejam os conflitos administrados com objetivos salutares, na arregimentação da concórdia e do proveito possíveis, a que tais atritos podem oferecer.


A análise de semelhante tema será significativa a fim de conduzir-nos a uma outra face dos conflitos, geralmente desprezada, e que deve caracterizar os círculos da convivência espírita. Consideremo-los como sintomas que denunciam os misteres de ajustes entre seus membros, sendo que, quase sempre, surgem em razão da deficiência de comunicação que cria barreiras e bloqueia a criatividade.


A comunicabilidade de uma equipe determina sua fluência e produtividade. Quando tratamos de comunicabilidade intragrupal, não damos ênfase à forma como são expressas as mensagens, mas, acima disso, aos sentidos de apreensão da mensagem, aos sentidos pessoais, individuais, a ela atribuídos. Raramente procura-se ouvir e ensejar participação verbal e operacional nos serviços de equipe, propiciando que se enraíze uma face oculta nos mesmos, desconhecida, subliminar, porém, altamente determinante sobre o processo de consolidação ou desestruturação do todo. O estudo dessa nuança será de grande relevância para a eficácia dos resultados e a superação dos empeços nas realizações levadas a efeito por composições de pessoas, seja para que fins se agrupem.

Condicionamentos milenares no egoísmo sedimentaram o conceito de oposição a tudo que se escape de identificarem harmonia com nossa ótica pessoal de vida. Quantos guardem entendimento diversificado são tomados como onipotentes ou adversários nas relações interpessoais. Dificilmente nutrimos a mesma admiração pelos que contrariem nossos pontos de análise ou pelos que demonstrem insatisfação com nossas ideias, com nossos sentidos empregados ao entendimento dos fatos e dos conhecimentos.


As vivências sociais na religião e na política durante longo tempo estimularam ainda mais o caráter de indisposição declarada para quem não “reza pela nossa cartilha”. Nasce então o sectarismo como forma violenta de “resolver” as contendas, excluindo os contendores.


Conciliado com essa conotação de “ser contra” associou-se o sentimento de “gostar menos”, e os conflitos passaram a ser interpretados como uma “arena” na qual têm que haver vitoriosos e derrotados. Esse enforque faz-nos perder o que mais precioso pode existir nos lances conflituosos: o aprendizado e a dilatação da criatividade na busca de soluções.


Por essa razão será imperativo que os dirigentes e as próprias equipes doutrinárias orientem-se sempre ao treino e ao desenvolvimento da inteligência emocional, em favor das condições especiais de uma vida relacional sadia e enobrecedora, procurando enfocar os embates como sinais e notas. Sinais que indicam rumos a serem seguidos e notas que avaliam nossas reações ante as provas da tribulação.


Será de bom alvitre o cultivo das habilidades que envolvem a “negociação” e a busca de soluções, da empatia, da liderança participativa. Quando agimos com disciplina emocional, recorrendo à assertividade, isto é, ao domínio sobre o cosmo emocional, os atritos são educativos e podem levar a profundas reciclagens. Isso porque, quase sempre, os embates da vida em grupo só ocorrem em razão dos processos conflitantes que carregamos conosco mesmos, optando por sentidos nem sempre harmonizados ao bom senso e consenso grupais, vindo a extravasar-se, circunstancialmente, como objetivos personalistas.


Ante semelhantes fatos, a atitude de “neutralidade” emocional e meditação serão indício de maturidade afetiva e reeducação dos sentimentos nas convivências tormentosas.


Os homens estiveram em desatinado conflito com Jesus, com suas ideias, com suas movimentações, embora Ele, pacífico e sereno, conduzia os provocantes a mergulharem em si mesmos e a descobrirem suas insatisfações, frustrações e as raízes de suas emoções perturbadoras, com as quais intentavam afetar o equilíbrio do Mestre.


Nos grupos doutrinários muitos asseveram a necessidade de unanimidade, determinando que amoráveis seriam as equipes sem problemas e que jamais tivessem de conflitar. Entretanto, oficialmente essa será a tônica de grupamentos sérios e autênticos. Paulo, o missionário de Tarso, fala-nos do “bom combate”, aquele que vale a pena ser deflagrado para a introspecção, a autoavaliação, o bom conflito.


Grupos sem conflitos não crescem tanto quanto poderiam e, porque não exista o desentendimento e os desacertos manifestados, nenhuma garantia há de que, intimamente, os componentes não estejam em “litígios”. Eis a importância da sinceridade fraterna, com pleno respeito pelas opiniões alheias, adotando lídima postura de alteridade ante os diferentes e as diferenças, buscando entender as razões subjetivas de cada componente para seu proceder, conhecendo-lhe com mais profundidade os dramas pessoais, sem o que ele será apenas mais um no aglomerado de pessoas. Essa é a tarefa que distingue um grupo que cria elos de afeto de uma reunião de criaturas que se ajuntam sem tecer a rede da fraternidade legítima.


Convenhamos que as tribulações surgem em razão das estruturas íntimas que carreamos para a vida de relações, chamando-nos algumas vezes a muita paciência e tolerância com o outro. Em verdade, a luta é toda nossa, pois ainda não conseguimos decretar a alforria desejada sobre muitas imperfeições, guardando expressivos limites na forma de interpretar as mensagens que compõem o nosso campo de ação doutrinário.


Assumamos em quaisquer circunstâncias de luta a diretriz do perdão, evitando magoar-se com as ações alheias em razão do incômodo que nos causem. Melhor perdoar a ter que carpir o arrependimento.


Ante as tribulações do conflito que não pudemos evitar, recolhamo-nos em atitude elevada, longe dos reflexos costumeiros das emoções conturbadas, e preparemo-nos para extrair suas lições.


Arrimemo-nos na oração nos instantes em que nos situarmos na zona dos conflitos, não perdendo os frutos do teste de abnegação e harmonia. Diluamos a angústia proveniente de semelhantes ocasiões fazendo um autoexame leal com a consciência, procedendo a uma decisão incomum e educativa que venha somar nos destinos das tarefas às quais somos colaboradores, adotando a postura de humildade e desculpa, distante do orgulho dos pontos de vista pessoais, ensejando que a brisa da concórdia possa roçar os nossos corações no entendimento e fraternidade.


Façamos assim e saberemos extrair o grande benefício do conflito que é a sua capacidade de abalar nossas certezas.


Só os invigilantes e autossuficientes têm certeza de tudo e não querem renunciar as suas verdades pessoais em busca de novos horizontes.


Habituando-nos paulatinamente a esse mister aprenderemos a arte sublime de debater com a vida e com todos, sem o exaurir desnecessário de forças interiores nos entrechoques da convivência, convertendo cada ocasião de conflito em convite à promoção pessoal, ainda que o outro não deseje o mesmo.

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Amigos queridos da direção de grupos.


Envidemos esforços pela renovação de conceitos em nossos conjuntos cooperadores.


Discordar com acerto é uma habilidade a ser cultivada na escola do centro espírita que ser-nos-á valoroso preventivo contra o dogmatismo e a perigosa monopolização cultural.


Temos observado que o melindre, essa doença de nossas mentes, tem sido álibi para que se evite dizer o que se pensa, excedendo-se em cuidados e proteção, suprimindo a sinceridade edificante que deveria constituir-se em uma das condições especiais prioritárias citadas pelo codificador em nosso trecho de análise.


Evidentemente, cuidar para verbalizar as críticas ou discordâncias é vigilância operante, contudo, evitar a verdade, a pretexto de prudência, é omissão conivente.


Nossos grupamentos precisam aprender a lidar com os momentos de aspereza ou alteração emocional com equilíbrio e resistência para que não se tornem “flores de estufa”, que ao primeiro golpe murcham em suas metas e desistem de seus ideais, acalentando profundas e doloridas mágoas.


Grupos que se amam verdadeiramente sabem dizer o que pensam, conflitar sem perder o amor uns pelos outros, conquanto isso custe ter que conviver com um “lado” que gostariam de já ter superado no campo das emoções.


Estejamos atentos com a santidade de superfície que tem dominado alguns conjuntos espíritas, que se desestruturam em fases de aferição. Decididamente, e sem receios, saibamos sondar a face oculta dos grupamentos doutrinários e oferecer condições aos demais para essa iniciativa, a fim de que ela não se transforme em sombra agradável para exploração obsessiva.


Os benefícios do conflito superado são muito extensos e fortalecedores, mas só serão possíveis se cuidarmos dessas condições especiais em fazer reinar entre os integrantes os valores do afeto, do estudo, da conversa franca, do tempo para conviver, da amizade respeitosa sem os excessos da intimidade, do trabalho operoso e do estudo libertador, primando pelo cultivo de laços genuinamente cristãos.


Sejam os dirigentes de equipes os primeiros a saberem externar com lucidez e ponderação os seus reclames, seus alertas, suas insatisfações, orientando aos demais como falar das emoções sem ter que extravasá-las em ações que geram mal-estar. Eis a habilidade da parcimônia, da conciliação, da contestação terna, que leva o grupamento a penetrar o sombrio mundo das insatisfações pessoais, escudados pela afabilidade e doçura reinantes, criando assim o bom conflito, doloroso, incômodo, porém, benéfico e promotor.


Ermance Dufaux


(Extraído do livro Laços de Afeto, 1ª ed., editora INEDE, pág. 160/164,
 psicografia do médium: Wanderley Soares de Oliveira)

terça-feira, 6 de outubro de 2009

MOMENTOS DE TRANSIÇÃO


Vivemos momentos importantes de transição do Planeta Terra. É chegado o tempo de transição para a regeneração dos Espíritos vinculados ao sistema terreno, bem como a regeneração do próprio Planeta.

A situação contemporânea da Terra, que se encontra em intensa convulsão, não é resultado de agora, são as atividades do homem e também necessidades geológicas, vez que o Planeta continua em evolução.

A responsabilidade do homem é a do seu aprimoramento intelectual e moral, conquistando a ampliação do seu estado de consciência, pelos seus esforços, pela observação de suas próprias atitudes em relação a si mesmo, ao próximo e a Natureza, que o envolve, que o mantém, pois faz parte dela.

O desgaste do ambiente natural foi provocado pelo homem desde todos os tempos, sendo que se agravou nos tempos mais modernos, quando a ganância desenfreada acelerou a destruição, com grande desperdício de elementos naturais.

Deus criou a Natureza em favor da Criatura e o Planeta Terreno serve grandemente à evolução dos seus habitantes, visando suas experiências e seus progressos. Através das inúmeras reencarnações os Espíritos ganham um pouco mais de consciência e de responsabilidade diante da vida. Todos sabem que somos seres espirituais indestrutíveis e em crescimento constante.

Nestes dias de tormentas, onde se constatam grandes convulsões terrenas, que na verdade são reações aos grandes e constantes ataques desestabilizantes ao Planeta, que é um organismo composto pelos órgãos aéreo, marítimo, de superfície e subterrâneo, que reclama reequilíbrio, regeneração...

O Espírito evolui, o homem evolui, o Planeta evolui; o Espírito se refaz e se constrói, o homem cresce e se aperfeiçoa; o Planeta amadurece e se estabiliza, atende suas finalidades na ordem Divina. A rebeldia, a ganância, o egoísmo, desequilibram o Planeta, porque são emissões de vibrações deletérias, que sensibilizam e convulsionam as forças telúricas, tanto quanto as energias espirituais.

A responsabilidade cabe a cada um nas atitudes do dia-a-dia, nos seus pequenos afazeres, nas tratativas com as pessoas. A harmonia começa nas nossas menores atividades. O futuro não será construção amanhã, ele já começou há muito tempo, como nós, seres inteligentes, não somos construção de um instante, por vontade alheia, somos construção milenar, vivenciando as mais variadas possibilidades, sofrendo as consequências das nossas iniciativas e restabelecendo o que foi desarmonizado, assim ampliando nossa inteligência, nossa compreensão e a nossa consciência.

As convulsões terreais verificadas ultimamente fazem sucumbir populações inteiras e têm por finalidade estremecer as estruturas espirituais endurecidas, cristalizadas, refratárias dos povos de todos os Continentes. De forma geral, levam à reflexão sobre a necessidade do exercício da humildade, do respeito às pessoas e da suspensão imediata das atitudes egoístas individuais e coletivas. Todos nós estamos inseridos no mesmo organismo, que é o Planeta, e dele dependemos para a construção da nossa paz e  felicidade plenas. Não é possível que um estágio de vida harmonizado -- seja nas questões espirituais ou materiais -- exista sem consciência da responsabilidade socioambiental; todos dependemos de todos.

No futuro seremos nós mesmos que lá estaremos, com a construção que elaboraremos, a princípio na nossa própria intimidade, que se refletirá nas relações humanas, e encontraremos o Planeta e as populações que ajudarmos estabelecer. Tornaremos responsáveis por tudo àquilo que egoisticamente fizermos ou egoisticamente deixarmos de fazer. Pois, somente por deixarmos de fazer o bem já é um mal, como ensina a Doutrina Espírita.

Dorival da Silva

quinta-feira, 1 de outubro de 2009

Temperamento




        Christian Friedrich Samuel Hahnemann, nascido em 10 de abril de 1755, na Saxônia, um Estado alemão, foi o genial idealizador da Homeopatia, hoje reconhecida como especialidade médica em inúmeros países, inclusive no Brasil.

     Suas fórmulas dinamizadas atuam no perispírito, onde se origina a maior parte dos males humanos, conforme nos ensina a Doutrina Espírita.

       Hahnemann desencarnou em 2 de julho de 1843, aos 88 anos, após uma existência profícua, inteiramente devotada ao bem da Humanidade.

         Tão notável foi esse missionário da Medicina, que conquistou a honra de participar da Codificação da Doutrina Espírita, a partir das primeiras experiências de Kardec, em 1855, portanto apenas 12 anos após seu retorno à Espiritualidade.

          Em 1863, Hahnemann transmitiu, em Paris, breve e importante mensagem, inserida no capítulo IX, item 10, de O Evangelho segundo o Espiritismo (Ed. FEB), que transcrevo para apreciação do leitor:

        Segundo a ideia falsíssima de que lhe não é possível reformar a sua própria natureza, o homem se julga dispensado de empregar esforços para se corrigir dos defeitos em que de boa vontade se compraz, ou que exigiriam muita perseverança para serem extirpados.

          É assim, por exemplo, que o indivíduo, propenso a encolerizar-se, quase sempre se desculpa com o seu temperamento. Em vez de se confessar culpado, lança a culpa ao seu organismo, acusando a Deus, dessa forma, de suas próprias faltas. É ainda uma consequência do orgulho que se encontra de permeio a todas as suas imperfeições.

         Indubitavelmente, temperamentos há que se prestam mais que outros a atos violentos, como há músculos mais flexíveis que se prestam melhor aos atos de força. Não acrediteis, porém, que aí resida a causa primordial da cólera e persuadi-vos de que um Espírito pacífico, ainda que num corpo bilioso, será sempre pacífico, e que um Espírito violento, mesmo num corpo linfático, não será brando, somente a violência tomará outro caráter. Não dispondo de um organismo próprio a lhe secundar a violência, a cólera tornar-se-á concentrada, enquanto no outro caso será expansiva. 

          O corpo não dá cólera àquele que não a tem, do mesmo modo que não dá os outros vícios. Todas as virtudes e todos os vícios são inerentes ao Espírito. A não ser assim, onde estariam o mérito e a responsabilidade? O homem deformado não pode tornar-se direito, porque o Espírito nisso não pode atuar; mas, pode modificar o que é do Espírito, quando o quer com vontade firme. Não vos mostra a experiência, a vós espíritas, até onde é capaz de ir o poder da vontade, pelas transformações verdadeiramente miraculosas que se operam sob as vossas vistas? Compenetrai-vos, pois, de que o homem não se conserva vicioso, senão porque quer permanecer vicioso; de que aquele que queira corrigir-se sempre o pode. De outro modo, não existiria para o homem a lei o progresso.

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             Hahnemann aborda uma questão vital: o temperamento, o conjunto dos traços psicológicos e morais que determinam a índole do indivíduo, o seu modo de ser.

            Por não aceitar a existência do Espírito – o ser pensante, que sobrevive à morte do corpo – as ciências médicas e psicológicas tendem a situar o temperamento comum fruto de condições orgânicas.

           A agressividade, a depressão, o suicídio, os transtornos mentais, os vícios, estariam relacionados com disposições neurocerebrais, como uma programação biológica a fluir nas iniciativas individuais.

            Até os deslizes extraconjugais entrariam nesse rol de calamidades atribuídas à Biologia. Segundo alguns cientistas, visando à perpetuação da espécie, nossos genes controlariam nossas ações, induzindo-nos ao adultério, visto que, quanto maior a promiscuidade, maior a possibilidade de gerar prole numerosa.

           Imagine, leitor amigo, a defesa para o adultério processado pela mulher que deseja o divórcio: -- Senhor juiz, não tenho culpa! São os genes que me atormentam! Induzem-me a prevaricar!

        No fundo tudo estaria relacionado com a genética, explicando até comportamentos anti-sociais, como roubo, assalto, assassinato, suicídio...

             Diante do delegado:

            -- Ah! Doutor, eu não queria ser assaltante, mas é incontrolável, está na minha natureza. Das profundezas de meu cérebro os neurônios repetem: Roubar! Roubar! Roubar!

             Algo semelhante ocorre com o comportamento vicioso.

           Pretendem alguns cientistas que o bebum tem na estrutura cerebral determinada área ativada, a estimular a tendência para o vício.

           Reclama o alcoólatra:

           -- Meu cérebro é uma esponja etílica! Se não o encharco de água que passarinho não bebe, não me dá sossego!

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         Hahnemann adverte que tais raciocínios são equivocados.

            O temperamento é um atributo do Espírito.

          E ainda que haja no corpo determinado arranjo genético que possa exercer certa influência, essa condição orgânica é efeito, não causa.

           O corpo não determina; apenas exprime.

          O mesmo acontece com relação às doenças que, geralmente, refletem problemas espirituais.

         No Espírito estão as causas mais frequentes de nossos desajustes físicos e psíquicos.

             A depressão, por exemplo, pode ter um componente genético, mas a origem do mal está no Espírito que, ao reencarnar, imprime na estrutura física algo de sua maneira de ser, resultante das experiências do pretérito, combinando no automatismo reencarnatório elementos hereditários compatíveis.

             Devemos, sim, tratar dos efeitos no corpo, buscando a Medicina da Terra.

            Mas é preciso, sobretudo, tratar das causas no Espírito, buscando a Medicina do Céu. Esta relaciona-se com a atividade religiosa, a partir de conceitos de ordem moral que trabalham em favor de nossa renovação.

          Nesse particular, o Evangelho é o grande compêndio médico da Alma, com prescrições perfeitas para mudar nossa maneira de agir, nosso temperamento, nossas tendências.

             Por falar nisso, leitor amigo, diante de problemas envolvendo ânimo exaltado e agressivo, desavenças e ressentimentos, doenças e limitações, pessimismo e desânimo, e tudo o mais que nos cause transtornos, você tem consultado o Evangelho?

            Talvez não haja nada disso com você.

           Se assim for, parabéns! Certamente houve engano das potestades celestes em localizá-lo neste vale de lágrimas.

            Mesmo assim, seria bom não dispensar uma reflexãozinha diária em torno das lições de Jesus, ainda que por mero exercício de discernimento.

          É o estímulo de que carecemos em favor de um comportamento capaz de sustentar a saúde da alma.

Richard Simonetti
(Transcrito da revista Reformador, FEB, ano 126, nº 2154, setembro de 2008)