Você sabe orar? Poucos sabem.
Na Doutrina Espírita, quando se faz referência ao substantivo “homem” em seus escritos, está-se referindo ao ser humano, à humanidade. Portanto, trata-se do homem quando da mulher, que correspondem às características orgânicas de Espíritos reencarnados.
Todos os humanos da Terra -- não se trata de redundância -- estamos nos referindo aos que estão vinculados ao nosso planeta, como ensina O Evangelho Segundo o Espiritismo, capítulo III, itens 8 e 9:
“Nos mundos mais atrasados, os homens são de certo modo rudimentares. Possuem a forma humana, mas sem nenhuma beleza; seus instintos não são temperados por nenhum sentimento de delicadeza ou benevolência, nem pelas noções do justo e do injusto; a força bruta é a sua única lei. (…)” “Nos mundos que atingiram um grau superior de evolução, as condições da vida moral e material são muito diferentes das que encontramos na Terra. A forma dos corpos é sempre, como por toda parte, a humana, mas embelezada, aperfeiçoada, e sobretudo purificada. O corpo nada tem da materialidade terrena, e não está, por isso mesmo, sujeito às necessidades, às doenças e às deteriorações decorrentes do predomínio da matéria. Os sentidos, mais sutis, têm percepções que a grosseria dos nossos órgãos sufoca. A leveza específica dos corpos torna a locomoção rápida e fácil. Em vez de se arrastarem penosamente sobre o solo, eles deslizam, por assim dizer, pela superfície ou pelo ar, pelo esforço apenas da vontade, à maneira das representações de anjos ou dos manes dos antigos nos Campos Elíseos. (…).
Vivem o plano de vida material e o espiritual simultaneamente, embora essa realidade possa não ser compreendida sem o estudo do paradigma da reencarnação.
Pretendíamos apenas elucidar que existem seres humanos no Universo além da Terra. No entanto, a citação fala de mundos inferiores e mundos superiores -- em qual situação se encontra a Terra? Conforme a Doutrina Espírita, ela figura na faixa vibratória em que estagiam os mundos de provas e expiações. O próximo passo é a transição para um mundo de regeneração. A Escala Espírita pode ser estudada em O Livro dos Espíritos, de Allan Kardec, nas questões de 100 a 113.
A oração é o momento em que o indivíduo se eleva, por meio do pensamento e da vontade imbuída de um objetivo claro, ao Criador, a Jesus ou a algum Ser de sua confiança, em busca de algo para si ou para outrem: socorro, alento, coragem, esclarecimento para suas dúvidas. Também serve para agradecer por petições atendidas, pelos recursos da Natureza e pela própria vida, e para louvar a Deus em reconhecimento à Sua grandiosidade.
“Mas tu, quando orares, entra no teu aposento, e fechada a porta, ora a teu Pai em secreto; e teu Pai, que vê o que se passa em secreto, te dará a paga. E quando orais não faleis muito, como os gentios; pois cuidam que pelo seu muito falar serão ouvidos. Não queirais, portanto, parecer-vos com eles; porque vosso Pai sabe o que vos é necessário, primeiro que vós lho peçais. (Mateus, VI: 5-8)”.
Jesus ensina a orar referindo-se a entrar no aposento e fechar a porta. Que aposento é esse? E que porta é essa? O Senhor, quando orava -- e isso fazia com muita frequência --, ia para a montanha, para a margem do lago de Genesaré ou para algum lugar da Natureza, onde não havia aposento nem porta. Então, a que Ele se referia?
Naquele momento da Humanidade, não havia como explicar melhor. Jesus utilizou os conhecimentos cotidianos do povo para inscrever, no sentimento das Almas, uma ciência de fundo transcendente, que somente nos séculos futuros poderia encontrar entendimento. Ele falava ao Espírito do homem, conquanto imantado a um corpo carnal, que, por algum tempo, permaneceria evoluindo no tempo, e a semente lançada alcançaria o resultado da Ciência iniciada, quando o terreno espiritual estivesse fértil para a eclosão da sabedoria.
A moradia é o corpo, aquele em que se habita; o aposento é a Alma; e a porta corresponde aos sentidos, que dão acesso às realidades exteriores. O ambiente da oração é o estado espiritual. O Ser e seus valores, num impulso de humildade, buscam o diálogo sincero e honesto, onde o burburinho do mundo material não tem lugar. É o coração e a mente que vibram, sem palavras: é sentimento que adentra a frequência do Ente a ser alcançado, e a comunicação se dá Espírito a Espírito.
É certo que somos pequenos e não sabemos -- ou não temos entendimento suficiente -- para jornada tão grandiosa. Em razão disso, não ficamos abandonados: existem os Espíritos intercessores que acompanham o nosso caminhar nesta vida e fazem com que as rogativas, pedidos e os agradecimentos — quando há mérito -- cheguem ao seu destino e carreiem as virtudes de acordo com as nossas possibilidades.
Nada pode ser concretizado sem que exista conformidade com a Lei Divina. Os seres responsáveis pela execução do que advém dos pedidos não poderão ir além dos méritos de quem solicita, tanto quanto daqueles por quem se pede.
“A prece é sempre agradável a Deus, quando ditada pelo coração, pois, para Ele, a intenção é tudo. (…)¹”.
A prece livre é o sentimento que flui do estado espiritual de quem ora -- influxo singular --, nunca haverá outro igual, pois corresponde aos valores daquele Espírito que se expressa para a Divindade. Não são as palavras que dizem tudo, mas a essência de quem se manifesta, lançando-se na corrente energética universal. Atinge o objetivo e acolhe a retribuição.
Toda manifestação do indivíduo a título de oração -- seja lida, decorada ou em forma de repetição -- precisa ser considerada válida, sem se esquecer o ponto central de interação: “a intenção”. Ainda que, em grande parte, seja de pouca eficácia, já que a forma utilizada não proporciona conexão espiritual com o Ser a que se pretende alcançar ou com os intercessores, pode ocorrer que, em momento de dificuldade extrema, mesmo utilizando-se dessa forma de orar, o indivíduo entre, sem perceber, em um estado espiritual próprio da oração efetiva, “fechando a porta do aposento” e realizando a interação vibratória significativa, alcançando o atendimento para suas necessidades. Para isso, pode receber auxílio de um Espírito caridoso, que o ajuda a entrar por esse caminho vibratório, ainda que o desconheça.
“O que Deus lhe concederá sempre, se ele o pedir com confiança, é a coragem, a paciência, a resignação. Também lhe concederá os meios de se tirar por si mesmo das dificuldades, mediante ideias que fará lhe sugiram os bons Espíritos, deixando-lhe dessa forma o mérito da ação. Ele assiste os que ajudam a si mesmos, de conformidade com esta máxima: “Ajuda-te, que o Céu te ajudará”; não assiste, porém, os que tudo esperam de um socorro estranho, sem fazer uso das faculdades que possui. Entretanto, as mais das vezes, o que o homem quer é ser socorrido por milagre, sem despender o mínimo esforço.²”
Esses esclarecimentos são dos Espíritos reveladores da Doutrina Espírita e não deixam dúvidas de que tudo é trabalho e exige esforço. Trata-se de conquista pessoal. É a busca permanente da elevação espiritual, que corresponde à aquisição de valores nobres, intelectuais e morais, em todos os momentos da vida. O estado espiritual existente, por afinidade natural, propõe sintonia com Espíritos envolvidos nos mesmos propósitos de cada um de nós, e se conectam pela atmosfera mental que alimentamos, formando ligação com o mundo espiritual que nos é próprio. Assim, vivemos nos dois mundos simultaneamente; a qualidade dessa vivência corresponde às nossas escolhas.
A oração é uma via de mão dupla e chegará até onde nossas forças permitirem, até onde o combustível do mérito puder nos conduzir.
A fé raciocinada -- aquela que a Doutrina Espírita nos apresenta com a suas revelações sobre o homem e o mundo dos Espíritos, dando aos seus estudiosos clareza sobre a existência -- mostra a necessidade do esforço em todos os momentos da vida, de forma consciente, sabendo-se que a construção efetiva é a do Espírito. Assim, todos os trabalhos realizados com amor -- mesmo os difíceis --, sempre visando o bem, não importando a quem se destinem, mesmo que o beneficiário não reconheça, são, por isso, uma prece, uma oração. Pois o bem já existia na origem da intenção de quem o realiza, enriquecendo espiritualmente aquele que o pratica.
Aquele que sabe como orar, por que orar e para que orar é um Ser consciente em evolução espiritual. Sempre estará confiante, com coragem, paciente e resignado diante do que não pode mudar. Será vencedor de si mesmo, carregará consigo a paz e a felicidade, pois tem plena confiança em Deus.
Oremos!
Dorival da Silva
(Texto revisado, sem alteração significativa)
¹
O Livro dos Espíritos, questão 658
2 O Evangelho
Segundo o Espiritismo, capítulo XXVII, item 7 (final)
Nota: Todas as obras de Allan Kardec poderão
ser consultadas no endereço:
www.kardecpedia.com.br