quinta-feira, 29 de outubro de 2015

Entrevista: José Raul Teixeira - 2ª parte

Entrevista
Ano 2 - N° 91 - 25 de Janeiro de 2009 
MARCELO BORELA DE OLIVEIRA 
mbo_imortal@yahoo.com.br 
Londrina, Paraná (Brasil)

 
José Raul Teixeira:
“A prioridade maior do espírita deve ser adquirir o indispensável conhecimento dos princípios espíritas e ter a coragem de pautar-se por eles”
 
 
O leitor verá em seguida a parte final da entrevista que nos foi concedida pelo estimado confrade José Raul Teixeira(foto), em que ele responde a várias perguntas a respeito do Movimento Espírita no Brasil e no exterior. Na edição anterior, a entrevista focalizou problemas e questões da atualidade e temas de natureza doutrinária. 
Conforme explicado, as perguntas que compõem a entrevista foram formuladas pelos confrades José Passini, Ricardo Baesso de Oliveira, Arthur Bernardes de Oliveira, Jorge Hessen, Astolfo O. de Oliveira Filho, Célia Xavier Camargo – todos membros do  Conselho  Editorial –  e Orson Peter
Carrara,  Fernanda  Borges,  Wellington
Balbo, Antonio Augusto Nascimento e Katia Fabiana Fernandes, editores responsáveis pelas entrevistas publicadas pela revista.
Eis, a seguir, na íntegra, a parte final da entrevista: 
O Consolador: Por que razão escasseiam nas casas espíritas as reuniões que chamávamos antigamente de sessões de desobsessão, que tantos benefícios trouxeram a inúmeros cidadãos com problemas obsessivos? 
Há inúmeras razões para esses esfriamento na realização desse tipo de reuniões, algumas cujas raízes estão nas instituições enquanto outras podem estar nas pessoas que atuam nessas instituições na condição de médiuns.
Antigamente, ao que sabemos, as reuniões de desobsessão eram um momento sagrado do centro espírita, para o qual não se levava qualquer pessoa. Para dela participar, tinha-se que ser médium mesmo, com as condições morais de tal maneira firmes que suportassem o assédio concomitante ou posterior das entidades infelizes envolvidas, mantendo conduta ilibada na sociedade e na família, adquirindo o que se chama de autoridade moral.
Os médiuns de então, quase sempre pessoas muito modestas, mantinham um regime de dedicação aos trabalhos do bem, trabalhando a si mesmos para merecer essa convivência com os Prepostos de Jesus nesse labor de socorro espiritual.
Temos que convir a dificuldade de muita gente, hoje em dia, para assumir compromissos. Seja pelas experiências de indisciplina cultivadas, seja pelas condições das grandes cidades, que dificultam os translados das pessoas de um para outro lado. Assim, é costume em muitos lugares os médiuns faltarem muito aos trabalhos, porque chegam tarde da lida profissional, porque frequentam festas e não perdem nenhuma, porque qualquer motivo é motivo para não comparecer e, assim, não criam vínculos psíquicos com a atividade nem com os Benfeitores da tarefa.
No campo dos centros espíritas, muitos não têm critérios doutrinários para a escolha dos seus dirigentes das sessões e optam, quase sempre, por companheiros que mesmo quando têm boa vontade, desconhecem a profundidade e a dinâmica daquilo que foram chamados a fazer; não têm voz ativa, conquistada pela autoridade moral e pela convivência semanal  com os médiuns que, então, fazem como querem na sessão; não exigem dos membros das sessões mediúnicas a participação nas reuniões de estudos do centro, o que permite que muitos médiuns só compareçam à instituição nos dias e horários dessas sessões, não conseguindo higienizar as mentes por meio dos estudos, das análises, das discussões felizes, das trocas afetivas, mas mantendo cacoetes dispensáveis que afivelam à mediunidade propriamente dita, predispondo-se muitas vezes ao surto anímico ou às investidas mistificadoras, que proliferam nos terrenos onde vigora a invigilância.
Poucos dirigentes espíritas sabem que não deve ser qualquer médium convidado para  atender aos trabalhos desobsessivos. Não é por ser psicofônico, vidente ou psicógrafo que um médium terá condições gerais para participar de trabalhos tão graves, tão sérios. Pessoas que mantêm o tabagismo, o alcoolismo ou o uso de quaisquer outras drogas de tropismo neurológico; indivíduos que mantêm-se nas faixas da prostituição sexual, por mais modernas que estejam tais práticas nas metrópoles e quejandos, certamente não serão os mais recomendados para atender nessas sessões. Mas pessoas de língua grande, que não sabem guardar a discrição exigida por esses labores bem como as que portam desarranjos emocionais, que gritam, que se acabam de chorar se chove ou se faz sol, não devem ser chamadas para tão sérios compromissos.
São encontrados ainda, em muitas instituições, médiuns que não se falam, que estão brigados, participando dos serviços de mediunidade com o objetivo de atender à desobsessão. Acintes desses tipos contribuem bastante para que as sessões vão deixando aos poucos de ser sessões de desobsessão para converter-se em sessões de obsessão.
São, realmente, muitas as possíveis causas do esvaziamento das condições espirituais de uma atividade desobsessiva, mas, fundamentalmente, encontramos como causa primordial o próprio ser humano, inadaptado às disciplinas, desejoso de fazer o que lhe dá na cabeça, ou, pela ausência de conhecimento e maturidade, tornando-se instrumento de fascinadores, de mistificadores que, quando não os torna grandes empeços no corpo das sessões, afastam-nos do grupo, a fim de explorá-los mais facilmente, impondo-lhes a perda da oportunidade reencarnatória.
Somente a seriedade do trabalho, baseado no estudo sério e continuado, da ação fraternal em favor dos necessitados a nossa volta associada aos esforços pela autotransformação, farão com que retornemos às sessões de desobsessão que reflitam o Pentecostes, em cuja estrutura os filhos do Calvário, os caídos e os sedentos de luz poderão reencontrar o coração vivo e amoroso do Mestre Jesus. 
O Consolador: Qual deve ser a atitude dos dirigentes espíritas relativamente a essa enxurrada de obras mediúnicas de origem duvidosa, que tem infestado o mercado de publicações espíritas nos últimos tempos? Será que Kardec, no seu tempo, ficaria calado diante dessas obras?  
Acredito que num período em que o planeta está vivendo tormentos de todos os tipos, confirmando o que considera Allan Kardec, em seu livro A Gênese, ao afirmar que, hoje, não são mais as entranhas do planeta que se agitam: são as da Humanidade, não poderia o nosso Movimento Espírita estar livre dessa avalanche atormentadora de más influências, seja de indivíduos aventureiros e insanos  que anseiam por vitórias passageiras e/ou lucrativas, sem a necessária consciência do tipo de semente que estão plantando para colheita complexa no porvir  seja de entidades desencarnadas que continuam zombando dos esforços da Luz, das Falanges Crísticas,  que visam desfazer as sombras que  se demoram sobre a Terra.
Na medida em que os dirigentes espíritas vão se tornando mais lúcidos e, por conseguinte, mais coerentes com os princípios do Espiritismo, conseguem dar-se conta de que qualquer obra que divulguemos em nome da nossa Doutrina deve ter a chancela do bom senso kardequiano. Compreenderão que não vale oferecer ao grande público tudo o que vai surgindo no mercado livresco porque tenha o título de obra mediúnica ou espírita, a fim de obter o tão esperado “lucro”. Primeiro, porque nem tudo o que é mediúnico tem que ser espírita, já que a mediunidade não é patrimônio do Espiritismo. Segundo, porque o critério utilizado pelo Codificador do Espiritismo para a seleção e publicação de textos é bastante rigoroso, indiscutivelmente responsável. Sempre que alguém se põe a publicar e a comercializar produtos sem qualidade genuinamente espírita, no mínimo comete o erro de lesa-verdade espírita, o que ao longo do tempo deve acarretar muitas coisas graves nas mentes dos que as leem sem os necessários filtros do conhecimento dos livros de Kardec.
Com relação a Allan Kardec, estou certo de que não aceitaria tal fato com a passividade que temos encontrado no nosso Movimento, uma vez que são muitos os dirigentes, nos mais variados níveis de responsabilidades, que não têm coragem de afrontar o status quo vigente nesse campo literário, seja para não terem aborrecimentos e se pouparem das investidas retaliadoras dos interessados na manutenção do que acontece agora, seja porque também não dispõem do necessário senso crítico para ver os elementos antiespíritas ou inverídicos  que tais obras contêm.
É na Revista Espírita, publicada por Kardec no mês de maio de 1863, quando ele faz um exame das comunicações mediúnicas que lhe eram enviadas, que encontramos suas palavras dizendo: Em grande número encontramo-las notoriamente más, no fundo e na forma, evidente produto de Espíritos ignorantes, obsessores ou mistificadores e que juram pelos nomes mais ou menos pomposos que as assinam. Publicá-las teria sido dar armas à crítica. Vemos, assim, que o Codificador do Espiritismo tomava posição e se pronunciava a respeito com a firmeza que o caracterizava.
Temos lido livros ditos mediúnicos onde são apresentados o chulo da pornografia, das descrições libidinosas, fantasiosas descrições que não suportam o crivo da razão espírita, ao lado de outras coisas sem nexo, sem sentido para o processo de renovação e crescimento da criatura humana, sob a ótica do Consolador. Vejamos o que escreve Kardec no texto supracitado: Para começar convém delas afastar (das massas) tudo quanto, sendo de interesse privado, só interessa àquele que lhe concerne. Depois, tudo quanto é vulgar no estilo e nas ideias, ou pueril pelo assunto. Uma coisa pode ser excelente em si mesma, muito boa para servir de instrução pessoal; mas o que deve ser entregue ao público exige condições especiais. Infelizmente o homem é inclinado a supor que tudo o que lhe agrada deve agradar aos outros. O mais hábil pode enganar-se; tudo está em enganar-se o menos possível. Há Espíritos que se comprazem em alimentar a ilusão em certos médiuns. Por isso nunca seria demais recomendar a estes não confiar em seu próprio julgamento. É nisso que os grupos são úteis: pela multiplicidade de opiniões que podem ser colhidas. Aquele que, neste caso, recusasse a opinião da maioria, julgando-se mais esclarecido que todos, provaria superabundantemente a má influência sob a qual se acha.
Vale a pena continuar a ler o que nos diz o Codificador, Allan Kardec sobre o tema em apreço: Aplicando estes princípios de ecletismo às comunicações que nos enviaram, diremos que em 3.600 há mais de 3.000 que são de uma moralidade irreprochável, e excelentes como fundo; mas que desse número não há mais de 300 para publicidade, e apenas cem de um mérito inconteste. Essas comunicações vieram de muitos pontos diferentes. Inferimos que a proporção deve ser mais ou menos geral. Por aí pode julgar-se da necessidade de não publicar inconsideradamente tudo quanto vem dos Espíritos, se se quiser atingir o objetivo a que nos propomos, tanto do ponto de vista material quanto do efeito moral e da opinião que os indiferentes possam fazer do Espiritismo.
Bem entendemos, pois, que Kardec não se acomodaria silenciosamente, como não se acomodou em sua época. Hoje em dia nos deparamos com um espírito acomodatício em nosso Movimento, o que se mostra indicativo do descompromisso de muitos com a grandeza e clareza do Espiritismo, nada obstante continuem ocupando as mais diversas posições nos seus campos de atividades. 
O Consolador: Um fato bem peculiar em grande parte dos Estados Unidos e da Europa é a existência de grupos espíritas fundados e mantidos por brasileiros, cujos trabalhadores e frequentadores são em sua maioria brasileiros. Poucos grupos conseguiram despertar nos nativos a vontade de aprender a doutrina espírita. O que é possível fazer para reverter esse quadro?  
Será sempre de muito bom proveito para o exercício da nossa humildade o fato de não atribuirmos aos brasileiros, que vivem no exterior, qualquer missão messiânica. É muito importante não introjetarmos na alma nenhuma vaidade relativamente a nossa postura diante de outros povos ou de outros países, se quisermos ser bem aproveitados pelo Mundo Espiritual Superior em qualquer labor feliz ao que nos queira vincular.
Não deveremos perder de vista que nesses países, para onde vão viver muitos brasileiros, existe uma ou mais culturas que lhes são próprias, tanto quanto existe a sua religião predominante. Imaginar que poderemos chegar em algum deles e fazer como fizeram no descobrimento do Brasil os religiosos portugueses, ou seja, montar o nosso altar (nossa mesa) e celebramos nossa primeira missa (nosso primeiro culto, sessão, etc.), à revelia dos  seus filhos naturais, dos seus hábitos ou de suas crenças, tendo todos a nossa volta nos adorando e nos aplaudindo, seria uma ingenuidade, para dizer o mínimo.
É bem real que muitos brasileiros que eram espíritas no Brasil, sentindo falta dos seus ambientes de atividade espírita daqui, tenham criado uma pequena célula de estudos, muitas vezes tendo início em suas residências, numa garagem, etc., e mais comum ainda é que acorram outros compatriotas que, seja pelo sentimento de isolamento em que se veem, seja por sua necessidade afetiva ou, de fato, pela sede de voltar a sorver em grupo as bênçãos dos estudos espíritas, desejam estar juntos.
A mim me parece que a proposta mais coerente será a de bem vivenciar, onde quer que estejam os brasileiros espíritas, de tal modo os princípios espíritas, que os nativos passem a ver neles, nas relações sociais que mantenham, pessoas com hábitos muito diferentes, com posições muito equilibradas e justas, em meio a uma vida relacional de muito respeito,  harmonia e lucidez. Isso, sem dúvida, arrastaria muita gente em virtude da curiosidade em saber em que fontes esses estrangeiros recolhem tanta clareza, tanto bom-senso e tanta firmeza de propósitos do bem para viver, mesmo diante das adversidades que são comuns para quem vive num país estranho ao seu.
Vemos, nada obstante, que os grandes problemas de aproximação com os nativos nas células espíritas que se formam, começam pelo fato de não haver o domínio da língua do país para um relacionamento equilibrado ou capaz de entretecer os necessários diálogos explicativos; por outro lado, outro impedimento é encontrado na situação documental de incontável número de brasileiros, uma vez que se acham na ilegalidade nesses países. Como conviver com quem poderá tomar contato com essa situação e possivelmente denunciá-los às autoridades? Como tornar-se “missionário” declarado, de fronte erguida e sem temores, quando se está ilegalmente em terras alheias?
Temos, ainda, outros elementos que pesam nessa relação de brasileiros com nacionais de outros países. É que muitos que são espíritas lá fora, não o eram desde o Brasil. Conheceram o Espiritismo no exterior. Assim, para muitos, faltam as habilidades de como administrar uma casa espírita, realizar as sessões, os estudos e as demais atividades, passando a ouvir e copiar as informações de visitantes, nem sempre amadurecidos para dar-lhes a orientação precisa. É assim que encontramos grupos espíritas de brasileiros no exterior que seguem a “linha” de alguém, conhecido seu, do Sul ou do Norte brasileiros, em outros grupamentos, os lidadores seguem a “linha” do Nordeste ou do Sudeste, e muitos mais ainda, não seguem somente indicações de federativas brasileiras, mas, o que quase sempre é mais complicado, ligam-se a maneirismos dessa ou daquela instituição do nosso país ou desse ou daquele médium, e os problemas se vão avolumando como se pode ver.
Assim, não se trata de reverter o quadro da ausência de nativos de outras nações em células espíritas de brasileiros em seus países, trata-se de os próprios brasileiros terem a clareza indispensável a respeito do que é o Espiritismo, da seriedade dos seus princípios e evitarem a “colagem” dos modos de fazer trabalhos espíritas no nosso país, e passem a prestar mais atenção na cultura do país onde estão, procurando melhor entendimento da mesma, a fim de melhor se aproximar dos seus nacionais.
É comum encontrarmos no exterior as células espíritas fundadas por brasileiros com nomes dos Guias conhecidos no Brasil que, por mais respeitados ou amados por nós, aqui, nada informam ou significam para o povo do país. Nenhum cuidado de identificar os vultos espíritas do país onde estão, a fim de que, a partir do nome  caso desejem dar nomes de pessoas  possam instigar a simpatia de quem dessas instituições queira se aproximar. Quantos nobres espíritas, espiritualistas importantes ou pesquisadores destacados conhecemos na Espanha, na França, na Bélgica, na Itália, na Inglaterra, na Alemanha ou nos Estados Unidos? Nomes espanhóis como os de Amália Domingo y Soler, José Fernandez Colavida (conhecido como o Kardec espanhol), Francisco Ballester Galés, Angel Aguarod; franceses como os de Léon Denis, Gabriel Delanne, Alexandre Delanne, Albert De Rochas, Paul Leymarie, Camille Flammarion, Jean Meyer; italianos como os de Eusápia Paladino, Ernesto Bozzano, César Lombroso; ingleses como os de Arthur Conan Doyle, Alfred Russel Wallace, Stainton Moses, William Crookes, Florence Cook; alemães como os de Johann Fredrich Zöllner, Gustav Fechner, Wilhelm Weber; americanos como os de Henry Slade, Cora Scott Hatch, Edgard Cayce, Harriet Beecher Stowe (médium que psicografou o famoso livro ‘A Cabana do Pai Thomas’), Abraham Lincoln, Horace Hambling, Frank Carpenter, Charles Schockle, Joseph Banks Rhine, dentre incontáveis outros nomes, mais ou menos famosos, médiuns, pesquisadores, escritores, trabalhadores diversos que em seus países estenderam luminosa ponte entre o território do materialismo e dos problemas humanos aos campos do Espírito imortal, donde procedem as inspiradas soluções para os problemas planetários.
Dessa forma, creio que o amadurecimento das comunidades brasileiras, que vão aprendendo a viver nos países dos outros, procurando acurar os estudos das línguas bem como um maior e melhor conhecimento das culturas desses países, sem o anseio perturbador e sem sentido de construir onde estejam uma “mini-república brasileira”, em sinal de respeito a quem lhes abriu as portas ou que os suporta, mesmo sob a incômoda lona da ilegalidade, alcançarão, com o tempo, a simpatia e a aproximação de muitos corações que passarão a interessar-se pelo Espiritismo. Por agora, e durante um bom tempo, precisarão os espíritas brasileiros no exterior levar a sério não apenas o Espiritismo, mas, e fundamentalmente, a realidade de que estão em alheias terras diante do dever de estudar, de trabalhar, de servir e, como propôs a nobre pensadora italiana, Chiara Lubich, aprender a florir onde Deus os plantou... 
O Consolador: Muitas casas espíritas não são filiadas à federativa do seu Estado. O que pode ser feito para que tal ocorrência seja minimizada?  
Uma vez que as adesões dos centros espíritas brasileiros às suas federativas estaduais são estabelecidas em bases fraternais, não existindo nenhuma imposição federativa, a não ser a exigência de que as práticas institucionais do centro estejam bem ajustadas aos ensinamentos da Doutrina Espírita, nem sempre são claros os motivos que levam muitos deles a não se filiar.
Quero crer que haja por parte das federativas o interesse nas filiações dos centros, a fim de que exista um Movimento Espírita mais fortalecido no qual os integrantes cooperem para maior e melhor divulgação do Espiritismo no seio da sociedade. Por outro lado, admito que seja também do interesse dos centros espíritas a vinculação às federativas, considerando-se as possibilidades de enriquecimento material e humano dos seus trabalhos, a partir da integração que se estabelece com as demais instituições, com as trocas de experiências, que se convertem em somatório que sempre visa o progresso.
Os dois campos, desse modo, devem se aproximar, procurar um contato mais fraternal possível, que permita a formalização do vínculo, ou seja, a filiação. 
O Consolador: Devemos entender como de responsabilidade do Movimento Espírita a construção e manutenção de hospitais, creches, asilos?  
Não; de nenhum modo o Movimento Espírita tem responsabilidade na construção de obras de assistência social. Todos os espíritas, cidadãos e cidadãs, devem ter sempre em mente que o que fazemos é um esforço que nos interessa não somente porque vamos amparar alguém, em termos materiais, mas também porque conseguimos pôr no campo prático muito dos elementos teóricos que aprendemos no Espiritismo.
Nenhum espírita deve ser ingênuo ao ponto de admitir que seja nossa responsabilidade construir obras de pedra. Pelos impostos que toda a sociedade paga aos cofres dos governantes, é da alçada dos poderes constituídos e não da nossa a construção das obras sociais de que necessite a sociedade.
Importante, contudo, é percebermos que, apesar da consciência que devemos ter de tudo isso, não nos cabe ver alguém padecendo ao nosso redor sem que tomemos alguma providência socorrista, uma vez que na nossa rua ou no nosso bairro o governo muitas vezes somos nós mesmos, os que nos achamos mais próximos dos necessitados. Alimentar os que têm fome, vestir os desnudos, visitar os enfermos e os presidiários, são ensinamentos que aprendemos de Jesus.
O que não deveremos é criar obras materiais e gastarmos todo o tempo e preocupações com elas  a neurótica agonia por realizar atividades que nos garantam dinheiro: os almoços, os chás, os lanches, os bazares intermináveis, costumam retirar senhoras e cavalheiros dos grupos de estudos, por pretextarem que estão muito ocupados e cansados na busca de recursos materiais  deixando de lado o tempo que pertenceria aos estudos espíritas, ao nosso aprimoramento como pessoas, nosso auxílio ao crescimento de outros companheiros,  imaginando que a caridade, como a entendia Jesus, dispensa o nosso esforço pelo aformoseamento espiritual próprio. Nada que nos retire do dever de aprender para crescer deve nos ocupar, primordialmente, os pensamentos.
Quem se sentir inclinado a realizar atividades assistenciais junto ao próximo, poderá apresentar-se como responsável voluntário em alguma obra social, em sua cidade, que trate de crianças, de idosos, de internos penais, de aidéticos ou de outros enfermos, etc. Se, porém, o nosso ideal institucional nos remete à criação e manutenção de alguma obra desses tipos, é por entendermos que daremos a devida conta de tudo. Não nos caberá viver reclamando da sorte, da indiferença do mundo ou da insensibilidade dos governantes. Tomemos do arado, conforme permitam nossas possibilidades, e avancemos contentes, estudiosos, reflexivos e fiéis servidores da Vida Imortal. 
O Consolador: Há um descompasso da época em que vivemos com relação à educação dos filhos. Os tempos diferentes da atualidade, diretamente afetados pela velocidade da comunicação virtual, trouxeram uma realidade difícil e complexa para pais e educadores, o que também afetou o movimento espírita, antes bem mais dedicado à evangelização infantil e às atividades da mocidade espírita. Como vencer o desinteresse de dirigentes espíritas quanto à importância da atenção a jovens e crianças em nossas instituições?
Em realidade, toda a nossa vida está pautada em algo que chamamos escala de valores. Cada indivíduo, assim, tem valores distintos dos outros. Para quem tem a educação dos filhos como algo importante, apesar dos tempos difíceis e dos desafios vividos, têm-nos juntos dos seus corações, amigos, companheiros, apesar de ter cada qual sua personalidade, seu temperamento, suas idiossincrasias. Para quem pensa primeiro nos recursos financeiros, nas aparências sociais, sem clara noção de que seus filhos são espíritos e que lhes não pertencem como objetos, com certeza encontrarão todos os impedimentos provocados pelas mídias, pelos companheiros dos filhos, e por tudo mais que teime em intervir no relacionamento doméstico.
Vivendo no mesmo mundo midiático que todos nós, atravessando as horas de aperto e violência como nós, bem como enfrentando as mesmas exigências econômicas, vemos irmãos de outras crenças bem junto aos seus familiares, indo as suas igrejas em conjunto, orando e vivendo. Por que somente os espíritas não conseguiremos trazer os filhos, educá-los conforme manda o figurino e fazê-los pessoas de bem? Alguma coisa está errada e, com certeza, não é com o Espiritismo, mas, sim, com as nossas escalas de valores.
Quanto aos centros espíritas e seus serviços de evangelização de crianças e de jovens, cabe-nos avaliar a sua qualidade, pois nessa época referida de comunicação virtual, de internets, de blogs e de tudo o mais, não se admite que as nossas “aulinhas” ainda sejam dadas à base de historinhas contadas oralmente  nem sempre há bons contadores de histórias nas casas espíritas o que torna enfadonha a exposição  e pelos quadros de giz, sem que os jovenzinhos participem, façam, busquem, investiguem, cantem ou “naveguem na rede”. É incontestável que nem todos os centros espíritas dispõem de recursos materiais para oferecerem aos evangelizandos o que há de mais moderno em termos didáticos-pedagógicos. Assim, deveremos investir na melhor qualificação dos nossos evangelizadores para que consigam cativar da garotada, desde a simpatia com que a receba até o modo como lhe serão apresentados os assuntos.
Olhando por outro prisma, não há como imaginar que filhos gostem de ir ao centro espírita para receber as instruções espíritas, sendo que seus genitores não vão, não se dedicam e, quando em casa, têm uma vida relacional bastante sofrível com a família. É, de fato, o exemplo que costuma arrastar. 
O Consolador: Considerando que o Espiritismo é uma religião eminentemente educadora e que o Espírito reencarna para aperfeiçoar-se, você não acha que as atividades que visam à evangelização  da criança têm deixado de receber o apoio na proporção da importância da tarefa? Por que não há um incentivo maior, da parte dos Espíritos, no sentido de chamar a atenção dos dirigentes de entidades espíritas para a evangelização infantil, a fim de que apóiem esse trabalho?  
Sim, quase sempre encontramos pouca atenção por parte de muitos dirigentes espíritas para com a evangelização infanto-juvenil. Vale a pena enfatizar a questão das escalas de  valores que têm os indivíduos e, em função deles, as instituições ou setores de atividades que eles dirigem. Tais escalas estabelecem o que poderemos chamar de missão da instituição.
Enquanto o objetivo dos espíritas não corresponder aos objetivos do Espiritismo, essas atividades não terão bom desenvolvimento. Muitos dirigentes dão grandíssimo valor às sessões mediúnicas (há centros que se orgulham de terem dezenas delas, em dias variados da semana), outros se esmeram nas atividades sociais junto aos pobres e estropiados, possivelmente porque não vejam sentido na orientação dos que estão recomeçando as próprias experiências no planeta.
A muita gente passa despercebido o fato de que as entidades atendidas nas sessões mediúnicas, como sofredoras ou como obsessoras, ou muitas daquelas que comparecem repletas de necessidades de toda a ordem, são exatamente aquelas às quais não se oportunizou a orientação para a vida, as instruções espirituais ou a evangelização, se quisermos tratar assim. Não vale a pena, então, deixarmos as crianças e os jovens ao abandono das preciosas lições de renovação espiritual, a fim de que, no futuro, não se tenham muitas almas a serem atendidas nas sessões mediúnicas ou nos trabalhos de assistência material. Parece-me um contrassenso ver confrades espíritas que não valorizam esses labores espirituais profiláticos.
De parte dos Espíritos, não têm eles mais como tentar despertar os encarnados das suas ilusões ou da sua letargia. Há anos, o Espírito Estevão, Guia Espiritual do saudoso médium capixaba Júlio Cezar Grandi Ribeiro, escreveu numa mensagem uma frase que a Federação Espírita Brasileira tomou como slogan para as suas campanhas evangelizadoras: A criança e jovem reclamam orientação no bem. Evangelize, coopere com Jesus. Temos recebido incontáveis instruções do Mundo Espiritual enfatizando a grandeza da evangelização ou espiritização da criança e do jovem, seja nos textos de Emmanuel, de Joanna de Ângelis, de Estevão, de Camilo e de tantos outros Benfeitores que luxuriam esse escrínio de luz das orientações imortais que nos chegam na Terra. Cabe aos espíritas estarmos atentos para as mesmas, refletir a respeito delas e as colocarmos na pauta das nossas ocupações e serviços na Seara. 
O Consolador: Pesquisa recente, realizada por importante revista brasileira, constatou uma triste realidade: os jovens espíritas, em sua maioria, aprovam o aborto e a pena de morte. Como vê essa questão? O que falta para que nossos jovens possam absorver os princípios espíritas, que são claramente contrários ao aborto e à pena de morte?  
É natural que os jovens frequentadores de centros espíritas tenham essa postura diante do aborto e da pena de morte. Eles estão discutindo esses temas nas escolas, nas universidades, nas rodas dos amigos, menos nos centros espíritas.
É muito comum encontrarmos grupamentos de jovens espíritas cheios de boa vontade, de alegria, de entusiasmo, mas sob a coordenação de pessoas que, por não terem o aprofundamento das teses espíritas, evitam tanger essas questões das quais não saberiam desincumbir-se perante os moços. Assim é que encontramos grupos enormes de moços espíritas que estão sendo treinados para cantar e tocar instrumentos com beleza e harmonia ou que se esmeram nas artes cênicas, tudo para apresentações de grande beleza estética, sem a menor dúvida, mas que se acham vazios dos conteúdos mais profundos trazidos pelo Espiritismo.
Aquilo que reprochamos em outras religiões está acontecendo nos territórios do Espiritismo. Lamentávamos as pessoas que tinham suas religiões para efeitos da vida social, e que nada recebiam delas para orientar suas vidas, para falar-lhes da morte, ressaltando o seu papel de Espíritos no mundo com grandes necessidades de amor e de instrução. Na hora mais apertada da existência essas pessoas estão perdidas e desesperadas, tendo vivido o tempo todo em redor dos altares, nos passos dos seus líderes ou enredados a mil e uma cerimônias. Temos visto o mesmo nos campos do nosso Movimento Espírita, considerando-se as aplaudidas exceções.
Muitos dos nossos jovens, portadores das dificuldades trazidas do remotos ou próximos passados, que reencarnaram no seio do Espiritismo para que encontrassem a tábua de salvação dos coerentes e luminosos ensinamentos, diante da omissão ou inadvertência dos que com eles lidam, veem-se com dificuldade para suplantar as pressões do sexo destravado, da drogadição, da violência ou da vida fútil, perdidos entre baladas e embalos, marcados por tatuagens e perfurados por piercings, sem nenhum cuidado consigo mesmos, como quaisquer jovens com os quais nos deparamos pelos caminhos.
O Espírito Emmanuel, por meio de Chico Xavier, escreveu no cap. 151 do seu livro Caminho, Verdade e Vida, que não podemos esquecer que a mocidade é a fase da existência terrestre que apresenta maior número de necessidades no capítulo da direção.
Por que não consegue mais dialogar com os jovens? O que se passa na mente dos pais, dos dirigentes, dos evangelizadores, relativamente aos seus espirituais compromissos? É urgente a necessidade de mais acurados estudos e reflexões de todos os espíritas, pais, dirigentes, evangelizadores e jovens, a fim de que alcancemos o entendimento dos porquês da nossa vida na Terra e não atiremos fora tão formosas oportunidades.
Elucida-nos, ainda, Emmanuel que o moço poderá e fará muito se o espírito envelhecido na experiência não o desamparar no trabalho. Nada de novo conseguirá erigir, caso não se valha dos esforços que lhe precederam as atividades. Em tudo, dependerá dos seus antecessores. 
O Consolador: Em sua opinião, como os dirigentes espíritas podem auxiliar o jovem na canalização do vigor juvenil para a construção do mundo de regeneração?  
Primeiro, será preciso fazer do centro espírita um lugar agradável, fraterno e envolvente para a criança e para o jovem, sem nenhuma necessidade de que se construam piscinas, quadras esportivas ou salões de funk para que se sintam atraídos. O ambiente se mostrará agradável quando haja nele o envolvimento fraternal, onde o jovem possa exprimir-se, perguntar, opinar e apresentar seus problemas sem receber olhares de superior hipocrisia. Depois, será importante que seja convidado a participar das atividades da instituição que estejam ao nível das suas possibilidades, o que implica que os lidadores mais velhos deverão conhecer os mais moços por estarem junto deles, acompanhando-os, observando-os e assistindo-os.
O jovem não se fixará em instituições onde não tenha nada o que fazer, onde só compareça para ouvir, sentadinho, leituras e falações de pessoas que supostamente saibam mais do que ele. De natureza muito dinâmica, é compreensível que, ressalvados os casos mais complicados, o jovem goste de cooperar, de participar ativamente, devendo ser para isso preparados. Convidá-los para acompanhar-nos em visitas a outras obras, a outras instituições, a entidades que prestam serviço ao semelhante necessitados quais creches, hospitais, asilos, tudo isso vai sensibilizando a alma do Espírito reencarnado nas suas primeiras idades.
É muito bom quando temos, num centro espírita,  um relacionamento saudável entre os trabalhadores mais velhos e os jovens, uma vez que os primeiros precisam contar com a força e a disposição dos mais moços, enquanto estes carecem do norteamento e da experiência dos mais velhos. Quando isso se dá, em bases de afeto e de respeito, temos excelente conquista de corações para a liberdade, para a vivência ética e para o trabalho com Jesus. 
O Consolador: Uma das maiores preocupações atuais são os rumos do movimento espírita, visto que, em face do seu crescimento quantitativo, tem havido desvios e distorções graves. Todavia, o que é muito interessante, cresce também o interesse pela genuína divulgação espírita. Vivemos um paradoxo ou esses são mesmo os caminhos do amadurecimento da mentalidade humana, inclusive dentro do movimento espírita?  
É historicamente comprovado que todo movimento que se torna massivo costuma perder em qualidade, isso aconteceu com o Budismo, com o Cristianismo e o Espiritismo não escaparia. Vejo, no entanto, em nosso Movimento Espírita um fenômeno que para mim é muito preocupante, trata-se do espírito de descomprometimento de muitos companheiros que tomam a frente das suas atividades. Caso esses líderes, coordenadores, dirigentes, presidentes, ou que outros nomes recebam, sentissem mais ardor pelo Espiritismo, se o conhecessem a ponto de compreenderem que somos nós que crescemos quando o elevamos, com certeza haveria esse crescimento que acompanhamos no Movimento, sem perder, contudo, a qualidade.
Seria preciso que os centros espíritos fossem dirigidos por pessoas ou por grupos de pessoas bastante lúcidos, conhecedores dos fundamentos do Espiritismo e com acendrado respeito pelo público que, ávido, chega as nossas instituições desejando aprender ou necessitando de algum tipo de ajuda, ou as duas coisas em conjunto. Seria importantíssimo se os dirigentes compreendessem a afirmação do Espírito Bezerra de Menezes, quando escreveu pelas mãos de Chico Xavier que o centro espírita é o educandário básico da mente popular, e que, a partir daí, levassem a sério a sua missão de educar a mente humana, de orientar ou reorientar o espírito humano para que ele alcance seus nobres destinos ao largo da reencarnação. Enquanto isso for apenas um sonho, um devaneio nosso, não poderemos impedir que o Movimento Espírita sofra essa invasão de descomprometidos, de incautos e mesmo de alguns aventureiros, que se adonam das casas espíritas e de suas atividades e que impedem  estando a serviço do caos, dos inimigos do Cristo, consciente ou inconscientemente  o salutar desenvolvimento da sua mensagem pelo mundo.
Mesmo percebendo essa perda de qualidade na medida em o nosso Movimento cresce em quantidade de pessoas, aqueles que primam pela genuína divulgação da mensagem espírita devem continuar nesse afã, nessa empreitada, uma vez que cada um de nós dará conta à consciência do que tenha feito com os talentos da Doutrina, baseados que estamos na orientação que Jesus transmitiu aos Discípulos (Lc. 16,2) ao dizer que o administrador de um homem rico foi denunciado por defraudar-lhe os bens, e que foi chamado diante do dono dos bens e indagado: Que isto que ouço contar a teu respeito? Dá conta da tua administração... Repito, então, que cada qual terá que prestar conta da administração que fez desse tesouro, desse bem formoso que é a Doutrina Espírita. 
O Consolador: Como você vê o Movimento Espírita Brasileiro? Ele avança como deveria ou está aquém das expectativas? E mais: considerando os problemas que a sociedade terrena está enfrentando, qual deve ser a prioridade máxima dos que dirigem o movimento espírita, aqui e no exterior?  
O nosso Movimento Espírita brasileiro tem crescido na proporção das capacidades das suas lideranças. Quanto mais lúcidas, conhecedoras, dinâmicas e antenadas com o futuro, melhor se apresenta, aqui e ali, o nosso Movimento brasileiro.
Diante dos graves problemas experimentados pela sociedade de todo o mundo, na atualidade, a prioridade maior de todos os espíritas, particularmente dos dirigentes do Movimento Espírita de todos os lugares, deveria ser o compromisso de adquirir o indispensável conhecimento dos seus princípios e ter a coragem de pautar-se por eles no dia-a-dia das pelejas humanas. 
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Entrevista colhida na Revista Eletrônica "O Consolador", que poderá ser acessada através do endereço: 
http://www.oconsolador.com.br/ano2/91/entrevista.html