domingo, 10 de novembro de 2019

Obsessão ou Depressão

Obsessão ou Depressão 

 

“Quem tem olhos de ver, que veja.”  No mundo acelerado de hoje, as pessoas têm necessidades enormes. Embora diferentes em cada indivíduo, é uma epidemia que se alastra. Toma conta de crianças, jovens, adultos e chega na terceira idade. É contagiante. Causa dependência. Abre no peito um vazio que não se preenche com nada. Uma ânsia de algo a alcançar que não se alcança. A angústia se espalha, enraizando-se na alma, tornando-se uma obsessão.  

 

Ideias angustiantes e persistentes, dia e noite, pensamentos desconexos e presságios fantasmagóricos prenunciam catástrofes, apontando para a escuridão sem rumo. Surgem o medo, o pânico de algo que só o sofredor vê, está no caleidoscópio da mente, imagens, ruídos de toda ordem, movimentos atordoantes, constituindo um teatro de horrores.   

 

Permitimos a construção desse quadro horripilante ao negligenciar o que é mais essencial em nós. A consciência de que somos um ser espiritual, somos um mundo próprio, que temos a obrigação de zelar, aprimorar, enlevar, acima de tudo amar. Somos nós que continuaremos a nossa jornada infinita após o desgaste do corpo físico, pois ele nos proporciona valiosas lições que não se perdem com o tempo. O resultado dessa colaboração permanece em nossa alma.  

 

Nesta era moderna, existe um grande desejo de coisas, muitas vezes sem reflexão sobre a necessidade ou a conveniência da aquisição. Não estamos falando aqui de coisas materiais, das quais é fácil nos livrarmos quando elas entulham nossos armários e não nos servem mais. Precisamos ter cautela com as questões emocionais, os interesses morais - e muitas vezes imorais -, a ambição desmedida e o desrespeito ao próximo, em qualquer aspecto. Isso é especialmente verdadeiro para aqueles aspectos que não são demonstráveis em nosso meio de convivência, mas que são alimentados em nossa mente. 

Poluímos voluntariamente a nossa vida cotidiana quando não exercemos autocrítica sobre o que surge constantemente nas relações interpessoais ou através dos meios de comunicação.   

 

Muitos de nós aceitamos tudo sem análise crítica, sem questionar se é bom, útil, ou se possui algum valor real. Grande parte do que surge nas comunicações são lixos emocionais que se acumulam, não deixando espaço no campo emocional para aquilo que poderia ser útil e enriquecimento para a nossa alma.   Além disso, repassamos inconsequentemente o lixo que adquirimos sem reflexão para os grupos de relacionamentos virtuais. Muitas vezes, sem reflexão, esses grupos perpetuam o ciclo de compartilhamento inconsequente, criando um volume incalculável de perturbações em mentes viciadas pelo uso compulsivo de repetições. Isso forma uma corrente vigorosa de pessoas ansiosos, que ao mesmo tempo estão vazios de valores que enriquecem de si mesmas.   

 

Tudo o que pensamos é construção vibratória que possui imagem, cor, som, odor. As qualidades desses pensamentos podem proporcionar alegria, paz, serenidade, otimismo, amor, etc., ou tristeza, aflição, intranquilidade, pessimismo, ódio, etc. Tudo depende da mente que a cria e a alimenta. Somos os primeiros a nos beneficiar ou a nos tornar vítimas dos pensamentos que alimentamos. Depois aqueles para onde se direciona a intenção, o foco do interesse em ajudar ou prejudicar, poderá ser uma ação consciente ou inconsciente, porque não se conhece o mecanismo do pensamento, mas, como é lei natural, a livre vontade determina, de acordo com a sua intensidade e propósito, desde que o alvo vibre na mesma frequência, a interação ocorre por atração e similitude. O “Vigiai e orai, para não caírdes em tentação. (Mateus 26:41)”, é antídoto que Jesus deixou para a Humanidade, de forma a resguardar qualquer um de sofrer com as próprias criações mentais negativas ou recepcionar aquelas originadas de qualquer outra alma que esteja em desequilíbrio.  

 

O que é obsessão? “Obsessão é [...] o domínio que alguns Espíritos logram adquirir sobre certas pessoas. Nunca é praticada senão pelos Espíritos inferiores, que procuram dominar [...].” Allan Kardec: O livro dos médiuns. Cap. 23, item 237.   

 

Na continuidade desta reflexão, anotamos: “Assim como as enfermidades resultam das imperfeições físicas que tornam o corpo acessível às perniciosas influências exteriores, a obsessão decorre sempre de uma imperfeição moral, que dá ascendência a um Espírito mau. [...]”.  Allan Kardec: A gênese. Cap. 24, item 46. 

 

Por outro lado, observa-se a existência da auto-obsessão. Esta se manifesta no indivíduo que tem pensamentos persistentemente negativos, muitas vezes voltados contra si mesmo. Essa condição torna a pessoa vulnerável a influências negativas que podem intensificar seu estado mental, possivelmente levando-a a cometer erros graves.  

 

Tudo tem o valor que damos, tanto para coisas materiais, como para os interesses que estão somente na intimidade. Se são boas e equilibradas produzem alegria e felicidade, se são negativas e persistentemente desejadas, causam tormentos, podendo levar a autodestruição.  

 

A obsessão pode apresentar diversos graus de intensidade, variando desde incômodo quase imperceptível, como irritação com situações triviais e dor de cabeça fraca e persistente, até sintomas mais intensos. Estes podem incluir dor, náusea e outros desconfortos neurovegetativos que ocorre sem uma causa orgânica aparente.  

 

Quando surgem situações como as mencionadas acima, é inevitável a consulta com profissionais da medicinam psicologia e psiquiatria. É necessário aliviar as condições manifestadas no organismo, utilizando os recursos disponíveis para a situação. O acompanhamento desses profissionais é de fundamental importância para o paciente obsessivo.  

 

Pessoas que sofrem de problemas neurológicos resultantes de AVC, traumatismo, condições congênitas, entre outros, não estão imunes ao processo obsessivo.  Isso ocorre devido ao estado espiritual do indivíduo, levando em conta as dívidas morais adquiridas nesta ou em vidas passadas. Os credores desencarnados perseguem e cobram impiedosamente em qualquer circunstância, intensificando o sofrimento, numa vingança meticulosamente planejada. Este fato ocorre no plano espiritual, refletindo dolorosamente no organismo do enfermo, que apresenta nuances de sofrimento sem poder se expressar. Esta situação ocorre quando o paciente não tem condições de se expressar, devido a limitações neurológicas ou se encontre em um estado de semiconsciência ou mesmo num estado vegetativo.  

   

Qual é a solução para os casos de obsessão? Vamos buscar a relevância da condução moral e o exercício da fé raciocinada nas questões a seguir, conforme apresentada em 'O Livro dos Espíritos', de Allan Kardec:  

LE. 467. Pode o homem eximir-se da influência dos Espíritos que procuram arrastá-lo ao mal? 

“Pode, visto que tais Espíritos só se apegam aos que, pelos seus desejos, os chamam, ou aos que, pelos seus pensamentos, os atraem.”  

LE. 469.Por que meio podemos neutralizar a influência dos maus Espíritos? 

“Praticando o bem e pondo em Deus toda a vossa confiança, repelireis a influência dos Espíritos inferiores e aniquilareis o império que desejem ter sobre vós. (...).  

 

Registramos também:  

(1ª Epístola de Pedro, 4:8.) - Antes de tudo, mantende entre vós uma ardente caridade, porque a caridade cobre a multidão dos pecados. 

 

Obsessão e depressão têm alguma relação uma com a outra ou são a mesma coisa?   

 

A obsessão ocorre sempre no campo espiritual e é caracterizada por impregnações vibratórias de baixa frequência no perispírito, resultante de uma vivência moral em desalinho. Ela é alimentada mais por pensamentos e consequências negativas do que propriamente por atos desajustados, porque a intenção é prevalente na responsabilização do ser espiritual.  O que leva a entender que o registro das consequências que atravessam o tempo e vai de uma existência a outra existência do devedor, proporciona a cobrança persistente de um espírito ou vários. Cada um apresenta as suas características próprias.  Vale também apontar que existem variedades de obsessão, tais como: De espírito desencarnado para espírito desencarnado; de espírito desencarnado para espírito encarnado e vice-versa; de espírito encarnado para espírito encarnado.  

 

A depressão pode ser decorrente de situações cotidianas, como a perda de emprego, frustração amorosa ou a morte de entes queridos. A expectativa de algo muito esperado que não se realiza, gerando ansiedade por muito tempo... No entanto, o estado depressivo quem sente é a alma que reflete suas consequências no organismo. Isso pode trazer desde circunstâncias sutis de desconforto, que pode passar em pouco tempo, até se agravar. Isso pode levar a equipagem carnal a limitações de muitas ordens, tanto emocional quanto física, em algumas vezes levando o indivíduo ao suicídio. 
 
É importante considerar que os dois estados, embora ocorram na alma e tenham origens diferentes, apresentam manifestações orgânicas e comportamentais similares, o que pode causar confusão.  

 

Além disso, o estado depressivo pode atrair mentes também depressivas que estão no campo extracorpóreo, intensificando a depressão da pessoa encarnada.  

 

O tratamento profissional médico, com os medicamentos apropriados, trata do depressivo encarnado e proporciona uma insensibilidade do seu perispírito que impede a interferência direta dos depressivos espirituais. 
 

A interferência espiritual pode ocorrer de forma consciente ou inconsciente por parte do desencarnado. Quando se trata de cobrança de dívida, a chamada vingança, a ação é consciente. No entanto, quando a atração ocorre apenas por similitude, o espírito nesta situação pode nem ter consciência de sua ligação com a pessoa que sente a sua influência, caracterizando uma situação de inconsciência.   

 

Qual é o tratamento para essas situações? Embora o tratamento médico seja indispensável e não será discutido aqui, vamos nos concentrar no tratamento espiritual do obsidiado, que poderá ser obsidiado-depressivo ou vice-versa. No contexto do tratamento em uma Casa Espírita ou Centro Espírita, uma vez identificada a situação, geralmente é possível verificar, através da narrativa do sofredor ou de uma pessoa próxima que vivencia suas queixas, que o padecente frequentemente relata percepções de visões incompreensíveis, falas e ruídos persistentes que só ele escuta, cisma, medo e pânico, tudo sem causa aparente. Existem também situações de agressões físicas, similares a socos ou a estrangulamento...  

   

Muitas vezes, o sofredor encarnado, devido ao seu estado alterado, não tem condições de comparecer à Casa Espírita, ou pode até estar internado em um hospital. No entanto, isso não impede que ele recebe ajuda. O Centro Espírita bem-organizado também é um pronto-socorro espiritual, onde os médicos, os psicólogos, os psiquiatras do campo espiritual estão prontos para socorrer os Espíritos desencarnados que buscam atendimento.  Assim se atende o obsidiado e o (s) obsessor (es) ao mesmo tempo.  

 

Os recursos utilizados incluem elementos fluídicos e vibratórios, boa orientação e esclarecimentos, o acolhimento fraterno e interferência de um Espírito familiar ou amoroso que conquista a confiança do paciente espiritual. Dessa forma, é possível modificar o estado emocional e espiritual do obsessor, melhorando simultaneamente a situação do sofredor encarnado.  

    

A mediunidade é a ferramenta utilizada para atender situações de emergência e urgência. Homens e mulheres dedicados e preparados para essa tarefa contribuem para que a espiritualidade especializada possa realizar o trabalho de esclarecimento e orientação. Às vezes, isso envolve a contenção do obsessor ou obsessores, com o objetivo de diminuir os efeitos danosos no indivíduo encarnado e permitir que ele retorne a um equilíbrio possível. Na Casa Espírita, a assistência emergencial ao depressivo ou ao obsidiado, tem como finalidade proporcionar ao sofredor a oportunidade de buscar, através da evangelização e da realização de trabalhos úteis e nobres, a conquista do seu equilíbrio. Isso resulta na melhoria da frequência vibratória, com a superação de vícios e hábitos nocivos, vencendo o desequilíbrio moral.    

   

A cura da obsessão reside na melhoria moral do indivíduo, embora ele possa receber ajuda externa temporária. O crescimento moral leva ao aumento da frequência vibratória, libertando o sofredor da influência de espíritos maliciosos e vingativos. Trata-se de uma questão de afinidade.  

 

A oração, a água magnetizada ou fluida, o passe espírita e o estudo doutrinário contínuo são excelentes recursos para aqueles que desejam sinceramente se renovar. Trata-se de uma questão de caridade para consigo mesmo, ou seja, de se amar. Após alcançar o equilíbrio, é importante trabalhar para o bem daqueles que ainda não sabem como cuidar de si mesmos e que sofrem de obsessão. O lema da Doutrina Espírita é: “Fora da caridade não há salvação.”   

 

“Antes de tudo, mantende entre vós uma ardente caridade, porque a caridade cobre a multidão dos pecados.” (1ª Epístola de Pedro, 4:8.) -- repetimos propositadamente.  

   

E quanto ao medicamento e o acompanhamento médico para quem está em tratamento no Centro Espírita? Isso deve prosseguir normalmente. O profissional médico saberá ajustar a medicação de acordo com as melhorias observadas, pois a melhoria da vida espiritual do indivíduo se reflete plenamente no físico e no psicológico. No entanto, a trajetória é lenta e gradual, pois nas questões espirituais não há atalhos, é necessário uma verdadeira conquista.  


Dorival da Silva   



                                                             

terça-feira, 29 de outubro de 2019

Caridade


Caridade



Estamos vivendo os dias gloriosos da santificação de Irmã Dulce pela veneranda Igreja Católica Apostólica Romana.



Santificada foi toda a sua existência, em razão do seu inefável amor e socorro aos aflitos que passavam pelos seus múltiplos caminhos ricos de misericórdia.



Conheci-a, faz muitos anos. Éramos, então, muito jovens.



Foi na década de 1950, aproximadamente, quando a vi atendendo a um enfermo que  ajudava, quase o carregando sobre as costas frágeis.



Ofereci-me para ajudá-la e ela sorriu, agradeceu.



Não a conhecia naquela época. Lentamente, os seus exemplos de santa foram-se tornando populares, por atender especialmente os que se encontravam nas ruas sob as marquises dos edifícios ou nos alagados do bairro do Uruguai.



O seu vulto frágil e o seu sorriso angélico eram a presença de Jesus, junto aos Filhos do Calvário.



Intimorata e invencível, não se deixou abater pelos desafios do materialismo, pela perversidade da noite das paixões asselvajadas, pelas enfermidades, pelo descaso de muitos e sua indiferença, pela crueldade...



Com a mansidão de cordeiro, sensibilizou milhares de pessoas por ela convidadas ao amor, e com a luz da caridade iluminou e salvou vidas que se lhe entregaram em totalidade.



Não possuindo coisas, era detentora do amor de Jesus, que soube disseminar com elegância e altivez, tornando-se porto de segurança aos nautas perdidos no oceano tumultuado do abandono terrestre.



Visitei-a mais de uma vez, a fim de banhar-me na suave claridade da sua ternura e comovi-me com o seu exemplo de fé e abnegação, por sentir-me iniciante da vida sem coragem para enfrentar os dissabores por amor à Humanidade.



Aprendi a amá-la a distância, orando pelo seu holocausto em favor do mundo de paz e de justiça, de fraternidade e de equilíbrio.


Nesses passados anos, após a sua libertação do corpo, acompanhei as notícias da sua beatificação e posterior santificação, conforme os cânones e leis da sua Igreja.



Exemplo moderno da caridade recomendada por Jesus Cristo e disseminada pelo Apóstolo Paulo, ela superou as técnicas de assistência e serviço social, dignificando e promovendo os nossos irmãos em agonia, recurso que somente o amor consegue proporcionar.



Nestes dias de angústia e de sofrimento generalizado, necessitamos de incontáveis Santas Irmãs Dulce, a fim de que recuperemos a honra que abandonamos e vivamos a ética do amor que pode salvar o ser humano da sua inferioridade moral.



Sirva-nos a todos, cristãos, maometanos, judeus, indianos, religiosos e ateus, portadores de crença ou vivendo sem ela, a lição que nos ofereceu com sua existência ímpar, amando-nos e respeitando-nos, ajudando-nos reciprocamente, pois que Fora da caridade não há salvação.



Divaldo Pereira Franco

Artigo publicado no jornal A Tarde, coluna Opinião, em 17.10.2019

Em 23.10.2019.

segunda-feira, 2 de setembro de 2019

A nova geração em A Gênese


A nova geração em A Gênese *

                                                          Sandra Maria Borba Pereira

A temática da transição planetária está presente em nosso movimento espírita há algum tempo.  Eventos tratam do assunto, livros são publicados, palestras repetidas pelos quadrantes do país e fora dele.

Diante do quadro atual de violência em grande escala e fenômenos naturais destrutivos, ecoam as palavras: os tempos são chegados do fim do mundo!

Na quinta obra da Codificação Espírita, Kardec nos presenteia com o capítulo que encerra o livro, São chegados os tempos, nos oferecendo lúcidas e atuais reflexões em torno desse palpitante assunto para nos esclarecer e alertar, acalmar e motivar a nossa atitude perante a vida.

Sinais dos tempos

Partindo das previsões alarmantes de algumas denominações religiosas sobre os sinais dos tempos, assinalados por Deus, Allan Kardec, na sua natural argumentação dialética, começa por evitar posições antagônicas e radicais buscando compreender, antes de tudo, o sentido dessa expressão.  Homem de veia racional começa por tranquilizar o leitor -- espírita ou não – afirmando¹: se a nossa época está designada para a realização de certas coisas, é que estas têm uma razão de ser na marcha do conjunto.

O fio condutor de toda argumentação kardequiana diz respeito à lei à qual estamos todos submetidos: homens, sociedades, astros. É essa uma lei que atua tanto nas transformações físicas do nosso planeta quanto na depuração moral dos Espíritos, na sua destinação à perfectibilidade.  No campo mais propriamente material nos defrontamos com as sucessivas mudanças ocorridas em nosso orbe. No campo moral – e isso é por demais importante – algumas características revelam – ou poderão revelar – o alcance ou não de um certo progresso, a saber¹: desenvolvimento da inteligência, do senso moral e do abrandamento dos costumes.

Não pensemos, porém, que esses progressos se deem de forma isolada. Na sua visão dialética, Kardec acentua que o homem é também artífice do progresso material do globo através de sua ação intelectual e pragmática, quando responsável e produtiva para as coletividades e para a própria Natureza. É o chamado de atenção para a educação ambiental já apresentada nos idos de 1868 pelo Codificador.

Analisando o tema, Kardec nos esclarece sobre o mecanismo da Lei do Progresso, situando-o em dois modus operandi¹: um lento, gradual e insensível e outro caracterizado por mudanças bruscas, a cada uma das quais corresponde um movimento ascensional mais rápido.

Entrelaçando Deus, as Leis Naturais e o Homem, nos esclarece o mestre lionês que o progresso da Humanidade se opera, no geral, obedecendo à Lei Divina e, nos detalhes, subordinando-se ao livre-arbítrio dos homens, o que explicaria a diversidade das consequências do progresso, de comunidade para comunidade.

Dizer que os tempos são chegados seria, pois, dizer que a humanidade está madura para subir um degrau¹.

Seguindo a linha de raciocínio kardequiano chegamos a um ponto fundamental da Lei do Progresso: a vontade divina, em meio aos desassossegos da Natureza e vontades/ações dos homens, é que mantém a Unidade do Universo ainda quando se nos apareçam destacadas as perturbações dos elementos naturais e desequilíbrios individuais e sociais, frutos das ações humanas na sua construção histórica.

A essa altura do texto situa o Codificador que a Humanidades terrena atingiu incontável progresso como resultado concreto do avanço da Ciência e das Artes, exigindo dos homens a enorme tarefa de realizar um outro progresso, o moral, que consiste em² fazerem que entre si reinem a caridade, a fraternidade, a solidariedade, que lhes assegurem o bem-estar moral.

Destacando a necessidade de uma educação moral voltada para os bons sentimentos, afirma ainda²: Já não é somente de desenvolver a Inteligência o de que os homens necessitam, mas de elevar o sentimento e, para isso, faz-se preciso destruir tudo o que superexcite neles o egoísmo e o orgulho.

É essa a fase que devemos perseguir para assinalar de fato um novo período progressivo da Humanidade que deverá ser caracterizado por uma nova ordem social, caracterizada pelo progresso moral³, ou seja, por uma mudança radical na conduta moral dos homens.

Longe de condenar o bem-estar material (e nem o poderia dado ser o direito de viver o primeiro direito do Espírito encarnado e nisso está incluída a necessidade do bem-estar material, que não deve ser confundido com coisas supérfluas), Kardec esclarece que esse não basta para se garantir um mundo melhor. Segue-se à busca de um estado de bem-estar material a necessidade de se construir um bem-estar sociomoral.  O Codificador parecia ver o futuro que hoje nos mostra nações com alto nível de renda per capita e de riqueza em meio às drogas, ao suicídio, à pedofilia.

Para a Humanidade terrena chegou uma nova fase: a fase adulta, que reclama a superação de seus erros e ilusões pelo crescimento moral, único caminho capaz de assegurar a felicidade aos homens. As ideias se renovam com a renovação das próprias gerações que, lentamente, amadurecem, modificando aspirações, superando necessidades e métodos, ampliando os horizontes do futuro. Nesse trânsito, um paradigma novo sobre a vida e seu sentido precisa ser definido pela consolidação das ideias alicerçadas sobre uma nova visão de Deus, na aceitação da existência e da sobrevivência dos Espíritos. Isso fará com que se destruam por si sós os preconceitos de castas, os antagonismos de seitas.

A Nova Geração

Nesse momento do texto Kardec chama a atenção para o movimento de resistência daqueles que se mantêm no egoísmo e no orgulho, desejosos de parar a marcha do progresso.

Para superar tal resistência será necessária e inadiável a formação de uma nova geração que será responsável pela fundação da era do progresso moral que se distinguirá por ter Inteligência e razão geralmente precoces, juntas ao sentimento inato do bem e a crenças espiritualistas. 4   É essa geração que definirá um novo perfil para as coletividades e para a própria Terra, secundando o movimento regenerador do planeta.

Que se tranquilizem os apressados: esse movimento regenerador não será composto exclusivamente por Espíritos que já possuam processo consolidado anteriormente.  A nova geração pode se constituir tanto de novos Espíritos melhores como de antigos Espíritos melhorados, todos caracterizados pela disposição moral voltada para o bem e para o progresso, para a fé, a tolerância e a liberdade.

Lembrando a expressão crística do fermento na massa, essa nova geração terá a responsabilidade de levedar, com suas qualidades morais, a grande massa humana de insensatos, inseguros e imaturos, que tanto necessitam de exemplos e estímulos à superação de suas defecções morais.  

É essa nova geração que deverá fomentar, na massa social, os sentimentos de caridade, fraternidade, benevolência para com todos, tolerância para com todas as crenças, em substituição aos vícios que retardam o progresso da Humanidade 4: ciúme, apego às coisas materiais, sensualidade, cupidez, avareza e paixões degradantes.

“Há muito terreno a ser arroteado.

Mãos à obra!

Aremos!”

Ao concluir a leitura deste capítulo, restam-nos algumas questões que julgamos de capital importância:

·       Indicadas as características que deverá ter a nova geração fica a pergunta:  como proceder à sua educação?

·       Como nós, Espíritos imperfeitos e falíveis, podemos proceder a essa educação de Espíritos moralmente superiores a nós?

·       Que práticas educativas o Movimento Espírita poderá utilizar para o alcance desses elevados objetivos?

Em resposta à primeira questão já sabemos, conforme O Livro dos Espíritos, que será necessária uma educação moral baseada no exemplo e constituída por hábitos que exteriorizem sentimentos de elevação (ordem, previdência, respeito, solidariedade, fraternidade, autoconhecimento etc).  Se a nova geração encontrar esses encaminhamentos, encontrará também o solo propício para o desenvolvimento de suas boas sementes.

Quanto à segunda pergunta temos a considerar, a partir das elucidações kardequianas:

·       Somos educadores uns dos outros se entendemos por ação educativa a influência de um ser sobre outro, quer haja ou não uma supremacia, prevalecendo o caráter influenciador de nossas ações recíprocas.

·       Ainda que pequenos, espiritualmente falando, podemos, ao menos, não entravar a ação dos membros da nova geração. Podemos, por outro lado, colaborar, de forma ativa, pelo nosso esforço de renovação, pela ação evangelizadora que possamos desenvolver junto a esses Espíritos no lar, nas Casas Espíritas ou na sociedade. Embora pequenos, somos chamados à grande tarefa de evangelizar, educando, dando o testamento do trabalho redentor, oferendo ou recordando os subsídios evangélico-doutrinários aos irmãos que já galgaram outros degraus acima na escada evolutiva que nos aguarda a todos.

·       Não nos inibamos perante a nossa própria condição espiritual. Alegremo-nos. Sim, como o professor consciencioso se alegra diante do aluno prodígio que seguirá adiante, muito mais adiante que o mestre.

A última questão nos reporta a inúmeras mensagens ditadas pelos Espíritos enfatizando a tarefa educativa da Doutrina Espírita, com destaque para a página O Centro Espírita 5, da autoria espiritual de Djalma Montenegro de Farias, pela mediunidade de Divaldo Franco. Nela, o trabalhador do movimento espírita pernambucano caracteriza a casa espírita:  oásis, hospital, oficina, templo, escola. Em última instância: educação do corpo, da mente, da alma, das mãos, dos sentimentos.

O exemplo de dedicação e humildade de dirigentes e trabalhadores, a formação doutrinária sólida, o ambiente fraternal e instrutivo dos grupos de estudo e evangelização, a atmosfera de serviço redentor cooperativo, as possibilidades de integração em equipes de trabalho, os testemunhos de amor à causa do Bem são estratégias facilitadoras para a formação de uma nova geração nas fileiras espiritistas.

Evangelização Espírita Infantojuvenil

No quadro acima se destaca o trabalho da Evangelização Espírita Infantojuvenil destinado a todos, com vistas à formação do homem de bem, buscando, através de seus múltiplos núcleos, sensibilizar e esclarecer, amparar e iluminar, evangelizar e redimir, sem se preocupar exclusivamente com os da nova geração, confiante de que a semeadura pertence aos obreiros e o conhecimento sobre o tipo de solo e possibilidades de frutos pertence ao Senhor.

Preocupada com a mensagem espírita compreendida, sentida e vivenciada, a Evangelização Infantojuvenil e sua legião de trabalhadores anônimos, sem o aplauso do mundo, mas com a aprovação da própria consciência comprometida com a vivência evangélica, vem colaborando, há décadas, com a educação dos sentimentos junto à multidão de crianças e jovens que se aglutinam nos seus núcleos de trabalho.

Há muito o que fazer, conclui Kardec. Há muito terreno a ser arroteado. Mãos à obra! Aremos! Semeemos mas, sobretudo, procuremos dar o nosso testemunho pessoal de autoeducação moral, educando os nossos próprios sentimentos no Bem.

Utopia!** dirão alguns enfastiados pessimistas no plantão obscuro dos derrotados. Mas, o que será de nós sem a esperança, a utopia, o sonho?

Utopia hoje, sonho realizado... um dia...

Progresso sim, sempre, pela vontade de Deus... apesar dos homens, através da educação.



Referências:

1. KARDEC, Allan. A Gênese. Os milagres e as predições segundo o Espiritismo. Rio de Janeiro FEB,

    2002. cap. XVIII, item 2.

2. Op. cit.  cap. XVIII, item 5.

3. Op. cit. cap. XVIII, item 6

4. Op. cit. cap. XVIII, item28

5. FRANCO, Divaldo Pereira. Sementeira da Fraternidade   Por Espíritos Diversos. Salvador: LEAL, 2008,

     cap. 55.

(*) Capítulo constante do mais recente lançamento da FEP: Educação em Foco.

(**) Do grego ou+topos, lugar que não existe



Texto extraído do Jornal Mundo Espírita, da Federação Espírita do Paraná, agosto de 2019, número 1621, Curitiba (PR)