sábado, 18 de julho de 2020

O Anjo da dor

      O Anjo da dor 


A maioria das pessoas em todos os recantos da Terra está sofrendo, pois há uma parcela da população que parece indiferente ao sofrimento alheio e à sua própria segurança.  

 

        O mundo enfrenta uma pandemia de vírus COVID-19. Apesar de identificado, ainda não se conhece um medicamento, vacina, ou qualquer outro tratamento que possa detê-lo. Ele ataca vorazmente os organismos mais frágeis, minando todas as resistências e exigindo grande aparato de cuidados. Infelizmente, muitos não resistem à sua sanha.  

 

        As autoridades de saúde globais concordam que o distanciamento social, o uso de máscaras e a higienização das mãos são as medidas mais eficazes para prevenir o contágio. Se contaminado pelo vírus, três cenários são possíveis: o indivíduo pode ser assintomático, mas transmitir o vírus; pode apresentar sintomas leves, que podem ser tratados em casa; ou pode precisar de hospitalização e cuidados intensivos, caso o vírus comprometa o sistema respiratório e outros órgãos vitais.  

 

        As observações acima são apenas um preâmbulo para um novo modo de vida, o que está sendo chamado de 'novo normal'. Será mesmo? Enquanto a Ciência não descobre uma vacina ou medicamento capaz de conter a pandemia, torna-se necessário o exercício das virtudes. Para aqueles que não as possuem, é imprescindível adquiri-las. Onde as têm? Quem as disponibilizam? A quais preços? 

 

       O conhecimento e a vivência do Evangelho de Jesus fazem muita falta, pois iluminam os homens, ensinando-lhes a responsabilidade consigo mesmo e para com o próximo. Mostra que nossas ações, além de seus feitos imediatos, também têm consequências a longo prazo, conforme a chamada Lei de Retorno¹, como registra o apóstolo João, 5:29: “E os que fizeram o bem sairão para a ressurreição da vida; e os que fizeram o mal, para a ressurreição da condenação.”.  O versículo refere-se a reencarnação, o que ocorrerá no futuro como consequência do presente. Hoje, estamos vivendo reencarnação com reflexos das vidas passas. Portanto, é importante estar ciente de nossas ações, nosso modo de vida e nossas preocupações com o meio ambiente e com os outros. A grande síntese do Evangelho é o amor: “Amarás a Deus sobre todas as coisas, e ao próximo como a si mesmo.”.  

 

        As virtudes são um estado de sentir os efeitos de nossas atitudes, assim como a atitudes dos outros e os efeitos das circunstâncias da vida. Com a pandemia todos estamos dentro de contexto favorável a observarmos esses sentires. Quem pretende se conhecer não prescinde de se analisar, o que pede reflexão. Posso estar irritado, raivoso, com medo, inseguro… ou confortável, confiante, calmo… E esses são os meus sentimentos em relação aos vizinhos, aos colegas de trabalho, e todas as outras pessoas, conhecidas ou não, que compartilham o mesmo ambiente que eu. Todos têm sentimentos, têm familiares, têm pessoas que amam, têm suas próprias vidas.  

 

       Nos noticiários e imagens que inundam nosso dia a dia, encontramos principalmente publicidade de maus exemplos, inclusive de pessoas em posições de autoridade que não possuem autoridade moral. Eles são partidários de uma coisa ou de outra e não conseguem demonstrar justiça sem interesse pessoal. Razão pelo descrédito de suas ações, exceto pelos seus acólitos, cegos pelos seus interesses egoísticos que lhes beneficiem.  

 

       Portanto, será no mundo interior, como barco intacto em mar tempestuoso, que teremos que enfrentar desafios e dificuldades, mas mantendo-nos íntegros, com um Espírito que analisa, reflete, absorve o que o fortalece e descarta o que não contribui para o seu bem.  

 

        Precisamos renascer das ruínas de nós mesmos, em melhores condições, seja no dia a dia ou de tempos em tempos, e principalmente no final desta vida. Porque depois disso ressurgiremos para um estágio maior, para uma avaliação mais ampla, sem a possibilidade de erro no julgamento de nossas ações ao longo do caminho percorrido.  As luzes serão mais claras, a consciência se verá cruamente e a razão não terá razão que não mereça.  

 

        As gerações vão e vêm do mundo dos espíritos, que é a sua origem. Eles experimentam a vida corporal como uma oportunidade de aprendizado, expiação e provação. No entretanto, cada indivíduo é um mundo próprio, enfrentando a morte do corpo e entrando num novo organismo sozinho com a sua consciência.  Relembrando o ensinamento de Jesus: “E os que fizeram o bem sairão para a ressurreição da vida; e os que fizeram o mal, para a ressurreição da condenação.”. 

 

        A lição de Cristo é universal, pois se aplica em todas as partes do Cosmo Infinito. No entanto, ainda estamos limitados à Terra – devido ao nosso estado de inferioridade -- como ensina a Doutrina Espírita. Este planeta se apresenta de acordo com as necessidades do Espírito em evolução, servindo como lar, escola, hospital, prisão, asilo…  “A cada um segundo as suas obras.”.  

 

        As novas gerações chegam para substituir as que retornam, um processo que ocorre gradualmente ao longo do tempo. Cada Espírito traz consigo o seu próprio mundo e a sua própria herança, mas ainda sente o eco do progresso ou do desastre que sua geração anterior ajudou a criar. 

 

        Em todos os tempos da Terra, sempre houve muitas dores de todas as ordens, pois somos da classe de provas e expiações. Embora tenhamos feito algum progresso, ainda falta muito para o aprimoramento do Espírito se concluir, até chegarmos ao ponto de nos libertarmos e passarmos para a próxima classe, a dos regenerados. 

 

       Nos apegamos ao sofrimento porque hesitamos em resolver o egoísmo que, como visgo, nos prende a interesses mesquinhos que, embora proporcionem prazer e sensação, não resultam em felicidades. Muito apego ao que é material, com o embotamento dos valores espirituais. 

 

No endurecimento de nosso coração, na rebeldia viciada de contrariar a razão e ignorar a consciência, só resta o recurso extremo para ajudar os incautos viajantes sem rumo. Então, a Lei de Deus faz a sua parte em favor dos endurecidos, encaminha o Anjo da Dor, cuidando para que as lições do Evangelho de Jesus sejam ouvidas, entendidas e vivenciadas; com a agravante de que permanecerá até que os beneficiários se salvem de si mesmos, vencendo-se o egoísmo que os iludem. 

   

Será que a pandemia, que está causando milhares de mortes diariamente, será resolvida sem que exista um estado de humanidade em que cada indivíduo assuma a sua responsabilidade, tornando-se consciente de que a morte não visita apenas as famílias dos outros? O COVID-19 não conhece bandeira, nem raça, muito menos condição social, não reconhece nem moços e nem velhos, todos são terrenos alcançáveis.  

 

As autoridades e líderes de todas as esferas precisam exercer a humildade, deixando claro que ninguém tem o poder de repelir a pandemia e garantir a segurança de qualquer pessoa, apesar de todas as precauções que a ciência tem orientado. 

 

Chegou o tempo da fraternidade, do amor ao próximo, seja conhecido ou desconhecido, o momento da conscientização de que cada um é cidadão do mundo, independentemente de ser rico ou pobre, instruído ou não; independentemente de alinhamentos políticos à direita, esquerda ou cento.  

 

Allan Kardec, o notável codificador da Doutrina Espírita, no Livro dos Espíritos², na questão 740, fez a seguinte pergunta aos Espíritos nobres que trabalharam na terceira revelação das Leis de Deus:  “Para os homens, os flagelos seriam também provações morais, ao fazerem que ele se defronte com as mais aflitivas necessidades?”, obtendo a resposta: “Os flagelos são provas que dão ao homem oportunidade de exercitar a sua inteligência, de demonstrar paciência e resignação ante a vontade de Deus, permitindo-lhe manifestar seus sentimentos de abnegação, de desinteresse e de amor ao próximo, caso o egoísmo não o domine.”.  O que nos relembra que os flagelos aconteceram em todos os séculos passados, levando as gerações a impulsos de melhoramentos.  

 

A dor está presente em todos os lugares. Será que o Anjo da Dor veio nos apoiar em nossa inércia espiritual?  O que pensamos sobre isso?

Dorival da Silva 

 

1.      1.Obra: Pão Nosso, Francisco Cândido Xavier, Espírito Emmanuel, capítulo 127, publicação 1950. 

2.     2. Obra: O Livro dos Espíritos, Allan Kardec, lançado em 18.04.1857, tradução utilizada de Evandro Noleto Bezerra, FEB. 


              

quinta-feira, 9 de julho de 2020

Criança. O que define uma criança?


Criança. O que define uma criança?

       Como comumente se pensa, a criança é a construção da família, a perpetuação da espécie, algo muito esperado, uma novidade…

       Ter um filho é uma necessidade orgânica e emocional, portanto, é uma parte natural da raça humana. É muito desejado pela maioria dos casais que se unem no amor e na responsabilidade pela vida. Eles se esforçam para criar um homem ou uma mulher capaz de influenciar positivamente o meio social em que estão inseridos com seus valores intelectuais e morais. 

       Por outro lado, há crianças que surgem da irresponsabilidade, que não foram desejadas, que são o resultado de atos inconsequentes, mas ainda assim, elas chegam ao mundo. Por quê?

       Nem todas as crianças que nasceram em um ambiente amoroso, apesar de todos os esforços e da educação proporcionada, se tornam indivíduos moralmente retos, que possam inspirar confiança naqueles que convivem com eles. Isso acontece em detrimento de irmãos que tiveram as mesmas oportunidades e seguem um caminho comportamental regular. 

       A Criança que nasceu de encontro fortuito de seus pais, muitas vezes criada na pobreza e até mesmo por terceiros, em situação extremamente pobre, superando todo tipo de carência, nem sempre se desviará e se perderá na vida, tornando-se um adulto responsável e produtivo. Por que será isso?

       Concebida com amor ou de forma inconsequente, a criança surge para a vida, muitas vezes com problemas difíceis de resolver ou mesmo irreversíveis. Doenças congênitas, como o câncer de várias etiologias, deformações e degenerações neurológicas e psicológicas que requerem tratamento de longo prazo e sem solução definitiva, exceto casos excepcionais. Por que isso acontece?

       Mesmo os casais metódicos, que planejam ter filhos e fazem pré-natal, não apresentam nenhuma evidência que indique qualquer possibilidade de complicações durante a gravidez. No entanto, um fato inesperado pode surgir no desenvolvimento de um dos nascituros, que pode não ser percebido até algum tempo após o nascimento, ou mesmo durante a infância ou adolescência. Por que isso acontece?

       A Ciência, por meio dos profissionais de saúde, com algumas exceções, mas em uma proporção considerável, dada a prevalência do materialismo, sugere a interrupção da gravidez quando é notada alguma malformação fetal que não possa ser corrigida por intervenção intrauterina. No entanto, do ponto de vista espiritual, isso é considerado um grande erro, que compromete os pais, os intervenientes e os influenciadores que colaboram para tal ação. Por quê?

       E quais são as razões para isso?

       Antes de mais nada, precisamos definir o que é uma criança. É um ser que surge no mundo com a contribuição genética dos pais, que se unem para gerar uma estrutura física que nasce após nove meses de gestação. É um Espírito. O Espírito existia antes da concepção, tem experiências milenares, muitos acertos e muitos erros guardados na memória espiritual. Ele precisa de ajuda para se preparar adequadamente para assumir as responsabilidades da vida quando chegar à fase adulta nesta existência. Em alguns casos, o recém-chegado pode superar os Espíritos dos pais em sabedoria, porque espiritualmente é mais velho que eles. Isso significa que o renascido já viveu muitas vezes, assim como seus pais, e provavelmente conviveu de perto com eles, como parentes, amigos, inimigos... em inúmeras ocasiões. No entanto, não se pode descartar a possibilidade de ser totalmente desconhecido para eles.

       Lembramos que pais, avós e todas as gerações anteriores surgiram no mundo como crianças. Cada indivíduo possui sua particularidade exclusiva, demonstrada desde os primeiros movimentos no berço, seja com generosidade ou agressividade. A personalidade autêntica de cada um se revelará quando a organização física estiver mais desenvolvida e os recursos cerebrais permitirem uma expressão espiritual plena.

       Ressaltamos que todas as informações registradas nesta página são baseadas na Doutrina Espírita e as obras complementares. Optamos por não fazer referências detalhadas para que a leitura não se torne pesada, mas garantimos que nada aqui está sem fundamentação espiritual. 

       “Que seria de nós, se fôssemos obrigados a viver sob o tropel das pungentes recordações de antigos e medonhos erros?¹”. Por essa razão, renascemos como crianças, mantendo o passado resguardado no inconsciente e proporcionando a cada indivíduo a oportunidade de recomeçar. 

       Apesar do esquecimento das experiências das vidas passadas, manifestamos com os valores que possuímos. Estes estão armazenados e fluem diante das circunstâncias e desafios da existência atual, juntamente com as afinidades e familiaridades existentes no próprio espírito. Não é difícil verificar isso, observando-se as tendências das crianças desde muito pequenas. Algumas são dóceis e calmas, outras agressivas e irritadiças. Algumas têm facilidade com as ciências exatas ou com as humanas, outras com os esportes… As tendências refletem as vivências de vidas passadas.

       Desde os primeiros dias de vida, os pais podem ajudar o Espírito a corrigir ou diminuir a intensidade de suas tendências negativas. Eles podem auxiliar na reeducação de hábitos de outros tempos, como a tendência à violência, à viciação, à maldade, ao sensualismo… A postura positiva dos pais é de extrema importância para o espírito que busca se aprimorar, conquistando experiências nobres e modificando aquelas que perturbaram sua consciência espiritual antes de reingressar no novo corpo. 

        Há alguns anos, assistido a um filme sobre a vida de uma personalidade artística que teve muitos altos e baixos em sua vida, considerando as facilidades sociais oferecidas pela cidade em que vivia e também familiares que lhe permitiram isso, vindo a desencarnar muito cedo.  Fiquei pensativo sobre as condições daquele Espírito, que, com suas capacidades intelectuais e os meios de vida abundantes demonstrados, não encontrou condições favoráveis à sua presente reencarnação, tanto que morreu por seus excessos. Passados alguns dias, o Espírito do artista manifestou-se voluntariamente em nossa reunião mediúnica. Quando o identifiquei, travamos um diálogo, em certo ponto, lhe disse: agora que está ciente de que os excessos vividos e a liberdade desenfreada não foram favoráveis à melhor condução de sua vida no corpo, certamente procurará, quando for oportuno, o renascimento em uma família onde tenha pais enérgicos e lhe deem limites. Ele humildemente me respondeu que reconhecia a sua condição e que sabia que tinha perdido o direito de ter uma família. Na sua próxima jornada, iria nascer em uma condição paupérrima e seria abandonado, sendo criado em alguma instituição de acolhimento, em uma vida contida e mais favorável ao aprimoramento espiritual (diálogo nesse sentido, mas com outras palavras). 

       Essa lembrança corrobora o que as sérias obras mediúnicas comprovam, através de inúmeras narrações de experiências na vida de reencarnado e, posteriormente, no mundo dos espíritos, ou vice-versa. Elas mostram os modos de vida e suas consequências, que não são ficções, são realidades vividas. Se existe algum vislumbre de felicidade, também existem tempestades de lágrimas, que poderiam ser evitadas se a educação fosse adequada para o desenvolvimento da alma, e não apenas para atender às convenções do mundo material e às efêmeras conveniências do meio social contemporâneo.

       Sobre aleijões, síndromes mentais, demência, cegueira, surdez, mudez e outras deformações presentes nos nascimentos, são resultados do estado de consciência do Espírito, consequências de suas atitudes contra terceiros ou contra si mesmo.  Crimes hediondos, traição, vingança, ódio alimentado por muito tempo, suicídio… têm terríveis desdobramentos espirituais. Eles maculam a consciência, ou seja, ferem a Lei Universal, a Lei de Deus. Portanto, é necessário expiar o mal que perturba o espírito, e a passagem por um corpo desequilibrado é o melhor remédio para libertar a alma do sofrimento. No entanto, é preciso sofrer com resignação e extrair o melhor aprendizado do sofrimento; a revolta, a mágoa, o ressentimento agrava a aflição e não produz efeito favorável para o sofredor.

  Pode-se perguntar: o que os pais têm a ver com isto? É difícil dizer, mas não podemos fugir à verdade: nós, os pais, estamos comprometidos com a situação que se apresenta em nosso lar, porque participamos do fato, influenciamos atitudes ignóbeis ou fomos omissos diante do mal que poderíamos ter evitado. Sempre seremos herdeiros de nós mesmos. Trazemos para a reencarnação o nosso patrimônio que há milênios estamos construindo, temos o bem e o mal que realizamos. O bem não exige justificativa, o mal impõe correção, em qualquer época, porque a vida do Espírito é infinita.  Existem exceções, casais ou mães que assumem situações complexas por amor ao próximo, porque são altruístas.  

 

       Todos nós fomos crianças inúmeras vezes e teremos inúmeras oportunidades de ser crianças novamente. Vamos educar bem os filhos de hoje, pois podemos vir a ser filhos dos filhos deles e receberemos o reflexo da educação que lhes demos.  

 

       A criança traz em seus registros espirituais uma grande história de verdades, na qual a história de cada um dos pais se entrelaça, embora cada um saiba o que lhe pertence, espiritualmente falando. 

 

       Criança! Quem a conhece? 

      

                                 Dorival da Silva.

 1.                           1.   Obra: Diálogo com as sombras, escritor: Hermínio C. Miranda, pág. 253, 13.ª edição.