Em conta o
momento grave em que a Humanidade convive com altos e baixos nos diversos
segmentos da organização mundial: sociais, políticos, econômicos,
religiosos..., entendemos de muita importância rever os argumentos do
Codificador da Doutrina Espírita, o Sr. Allan Kardec, contidos na Revista
Espírita do mês de outubro de 1866, sobre "Os tempos são chegados".
Conquanto transcorridos 146 anos, a sua reflexão sobre o tema chega aos
nossos dias com o mesmo frescor de que quando de sua composição. Traz-nos
a lucidez de quem vivia além do seu tempo. Sabia perfeitamente interpretar os
assinalamentos coados do Mundo Espiritual, através dos diversos médiuns de
variadas partes do Planeta. Cabe-nos, indistintamente, a todos os
homens do Século Vinte e Um exercitar a meditação sobre os grandes problemas do
Mundo, principalmente daqueles mais próximos, onde se pode fazer
diretamente algum esforço de solução. Os "Tempos Novos" são
transformadores da alma humana, exigindo coparticipação de cada indivíduo
consciente, pois preconiza senso de responsabilidade.
O texto por ser muito longo vamos publicá-lo em cinco etapas, para
facilitar a análise e a reflexão do tema, que em nada prejudicará o
entendimento do seu conteúdo, o que faremos sempre às quintas-feiras.
Isto também visa não realizarmos nenhuma redução do texto ou montarmos um
mosaico de fragmentos, com o que haveria muito prejuízo sobre
a qualidade e a abrangência do que ensina o Codificador no referido escrito.
Bandeirantes (PR), 20 de março de 2013.
Dorival
da Silva
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Os tempos são chegados (parte 1)
Os tempos marcados por Deus são chegados, dizem-nos de todos
os lados, nos quais grandes acontecimentos vão realizar-se para a regeneração
da Humanidade.
Em que sentido devem ser entendidas essas palavras
proféticas? Para os incrédulos não têm a menor importância. Aos seus olhos não
passam da expressão de uma crença pueril sem fundamento. Para a maioria dos
crentes elas têm algo de místico e de sobrenatural, que lhes parece ser o
precursor da perturbação das leis da Natureza. Essas duas interpretações são
igualmente errôneas: a primeira, por implicar na negação da Providência e
porque os fatos realizados provam a veracidade dessas palavras; a segunda, por não
anunciar a perturbação das Leis da natureza, mas a sua realização.
Procuremos-lhes, pois, o sentido mais racional.
Tudo é harmonia na obra da Criação, tudo revela uma
previdência que não se desmente nem nas menores, nem nas maiores coisas. Em
primeiro lugar, devemos afastar toda ideia de capricho inconciliável com a
sabedoria divina; em segundo lugar, se nossa época está marcada pela realização
de certas coisas, é que elas têm sua razão de ser na marcha geral do conjunto.
Isto posto, diremos que o nosso globo, como tudo o que
existe, está submetido à lei do progresso. Progride fisicamente pela
transformação dos elementos que o compõem, e moralmente pela depuração dos
Espíritos encarnados e desencarnados que o povoam. Esses dois progressos se
seguem e marcham paralelamente, porque a perfeição da habitação está em relação
com o habitante. Fisicamente, o globo sofreu transformações, constatadas pela
Ciência, e que sucessivamente o tornaram habitável por seres cada vez mais
aperfeiçoados; moralmente a Humanidade progride pelo desenvolvimento da
inteligência, do senso moral e do abrandamento dos costumes. Ao mesmo tempo que
se opera a melhoria do globo, sob o império das forças materiais, os homens a
isso concorrem pelos esforços de sua inteligência: saneiam regiões insalubres,
tonam mais fáceis as comunicações e a terra mais produtiva.
Esse duplo progresso se realiza de duas maneiras: uma lenta,
gradual e insensível; outra por mudanças mais bruscas, em cada uma das quais se
opera um movimento ascensional mais rápido, que marca, por caracteres
distintos, os períodos progressivos da Humanidade. Esses movimentos,
subordinados nos detalhes ao livre-arbítrio dos homens, são de
certo modo fatais em seu conjunto, porque estão submetidos a leis, como os que
se operam na germinação, no crescimento e na maturação das plantas,
considerando-se que o objetivo da Humanidade é o progresso, não obstante a
marcha retardatária de algumas individualidades. Eis por que o movimento
progressivo algumas vezes é parcial, isto é, limitado a uma raça ou a uma
nação, outras vezes geral. O progresso da Humanidade se efetua, pois, em
virtude de uma lei. Ora, como todas as leis da Natureza são a obra eterna da
sabedoria e da presciência divinas, tudo quanto seja efeito dessas leis é o resultado
da vontade de Deus, não de uma vontade acidental e caprichosa, mas de uma
vontade imutável. Então, quando a Humanidade está madura para transpor um
degrau, pode-se dizer que os tempos marcados por Deus são chegados, como se
pode dizer também que em tal estação eles chegaram para a maturação dos frutos
e para a colheita.
Pelo fato de o movimento progressivo da Humanidade ser
inevitável, porque está na Natureza, não se segue que Deus a isso seja
indiferente, e que, depois de ter estabelecido leis, tenha entrado em inação,
deixando as coisas ir sozinhas. Suas leis são eternas e imutáveis, sem dúvida,
mas porque sua própria vontade é eterna e constante e seu pensamento anima
todas as coisas sem interrupção; seu pensamento, que tudo penetra, é a força inteligente
e permanente que mantém tudo na harmonia; se esse pensamento deixasse de agir
um só instante, o Universo seria como um relógio sem o pêndulo regulador. Deus
vela incessantemente pela execução de suas leis, e os Espíritos que povoam o
espaço são seus ministros encarregados dos detalhes, conforme as atribuições
relativas ao seu grau de adiantamento.
O Universo é, ao mesmo tempo, um mecanismo incomensurável,
conduzido por um número não menos incomensurável de inteligências, um imenso
governo em que cada ser inteligente tem sua parte da ação, sob o olhar do
soberano Senhor, cuja vontade única mantém a unidade por toda a parte. Sob o império desse
vasto poder regulador, tudo se move, tudo funciona numa ordem perfeita; o que
nos parece perturbações são movimentos parciais e isolados, que só nos parecem
irregulares porque nossa visão é circunscrita. Se pudéssemos abarcar o seu
conjunto, veríamos que essas são apenas aparentes e que se harmonizam no todo.
A previsão dos movimentos progressivos da Humanidade nada tem
de surpreendente para os seres desmaterializados, que veem o fim para onde
tendem todas as coisas, alguns dos quais possuem o pensamento direto de Deus, e
que julgam, pelos movimentos parciais, o tempo na qual poderá realizar-se um
movimento geral, como se julga previamente o tempo necessário para uma árvore
dar frutos, como os astrônomos calculam a época de um fenômeno astronômico pelo
tempo requerido por um astro para fazer a sua revolução.
Mas, certamente, nem todos os que anunciam tais fenômenos, os
autores de almanaques que predizem os eclipses e as marés, por exemplo, estão
em condições de fazer os cálculos necessários. Não passam de ecos. Assim, há
Espíritos secundários, cuja vista é limitada, e que apenas repetem o que aos
Espíritos superiores aprouve lhes revelar.
Allan Kardec - Revista Espírita - outubro de 1866